Page 4 - HOLOCAUSTO
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da população, essas mulheres eram facilmente corrompidas, para levarem e trazerem
mensagens aos prisioneiros. “Anna Gonçalves, 62 anos, foi condenada no auto-de-fé do
dia 23 de maio de 1660, por ter levado mensagens e causado um “grave prejuízo e
perturbação ao ministério do Santo Ofício”, foi também açoitada pelas ruas de
Coimbra”.
Vários casos como este são descritos por Geraldo Pieroni em “Os excluídos do
Reino”. “Madalena da Cruz atraída pela recompensa em prata, ouro e outras peitas”,
pediu a seu marido para levar algumas mensagens para certos réus que se
encontravam na prisão da Inquisição de Lisboa, onde ele era alcaide. Tudo teria dado
certo se Juliana Pereira, mulher do cirurgião Francisco Matos, não tivesse denunciado
o alcaide e sua mulher. Madalena, a mentora do crime, foi condenada, no auto-de-fé do
dia 10 de maio de 1682, a cinco anos de degredo para o Brasil”.
O DEGREDO
Para o Tribunal da Inquisição, o degredo era uma das formas mais eficazes de
expiação. O arrependimento das culpas era necessário para o salvamento de sua alma,
que o sentenciado, sem opção, preferia ser banido para uma região do interior de
Portugal, do que ser expulso do reino em terras distantes das colônias, principalmente
do Brasil.
Viagem longa e penosa, cujo sofrimento fazia parte de sua penitência. Para
Salvador a viajem durava em média oitenta dias. Para Recife sessenta dias e para o Rio
de Janeiro, noventa dias. “Todos os viajantes confessavam antes de embarcar e o
capelão celebrava missas todos os sábados e domingos. A fé era intensa nos navios onde
havia até mesmo pequenas procissões”. Destinados ao transporte de mercadorias, essas
embarcações eram impróprios para condução de passageiros. Obrigadas a dormirem
no convés, ficavam expostas as intempéries do tempo e do oceano. “A comida,
insuficiente e mal conservada, se deteriorava com facilidade”. Geraldo Pieroni cita a
saga do padre Jerônimo Lobo em uma dessas viagens que registrou: Os mantimentos
estavam “ruins e corruptos”, que tiveram que jogar no mar várias pipas de carne de
porco “podre e ardida”, assim como o vinho “que corria ao mar pelos embornais por
estar danado”. Referindo-se ao arroz: “vi eu lançando no convés tão podre mudado
que me resolvi ser cal e o crera de todo se me não certificasse de que era arroz”.
As carnes salgadas eram as bases da alimentação, ou “alguns peixes pescados
durante a viagem, os quais eram cozidos em fornos móveis instalados no convés. Por
causa da deficiência da alimentação e das péssimas condições de higiene, a saúde dos
passageiros degradava pouco a pouco. A bordo da maioria dos navios não havia
médicos e os viajantes não dispunham senão de uma pequena e elementar farmácia
manipulada pelos padres”. A morte era frequente durante essas viagens, a maioria
causada por escorbuto, (carência de vitamina C).
Os principais portos do Brasil, durante os séculos XVII e XVIII, recebiam
frequentemente centenas de banidos do reino, que vinham cumprir suas sentenças:
Recife, Salvador e Rio de Janeiro, onde flutuava grande contingente de “Índios, negros
foragidos do eito, mestiços, desajustados, ciganos, prostitutas, marinheiros, brancos
pobres, mendigos e soldados desertores”, aumentando a população, que vagava sem
destino.
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