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Marco Aurélio




                Elogio da divergência





                Com a aposentadoria de Marco Aurélio, a corte vive os últimos dias de
                convivência com um de seus juízes mais notáveis, originais e coerentes


                       epois de 31 anos como  a corte já teve, mas foi com toda certeza um dos mais singulares. A
                       ministro do Supremo  começar por suas posições que muitas vezes eram compartilhadas
                DTribunal Federal – e  com os colegas, mas que ele não fazia questão de alinhar com ne-
                mais de 42 de serviços prestados  nhum outro. Por isso transformou-se no senhor voto vencido, título
                ao país – o ministro se despede  do qual se orgulhava e que acreditava mais somar do que subtrair.
                da toga. O derradeiro dia anun-  Em um voto memorável, em que ficou vencido, Marco Aurélio
                ciado, 5 de julho, é exatamente  explica porque ficar vencido não é uma derrota pessoal, mas uma
                uma semana antes de comple- vitória da democracia: “É bom sempre lembrarmos Hans Kelsen
                tar 75 anos, limite imposto pela  quando afirma que a democracia se constrói sobretudo quando se
                Constituição Federal a servido- respeitam os direitos da minoria, mesmo porque esta poderá um
                res públicos.               dia influenciar a opinião da maioria. E venho adotando esse prin-
                  Marco Aurélio Mendes de Fa- cípio diuturnamente, daí a razão pela qual, muitas vezes, deixo de
                rias Mello, que sempre preferiu  atender ao pensamento da maioria, à inteligência dos colegas, por
                ser tratado pelo nome regimen- compreender, mantida a convicção, a importância do voto minori-
                tal que adotou sem os sobreno- tário”. Levantamento feito pelo Anuário da Justiça em 2016, mos-
                mes, não foi o melhor e muito  trou que de cada três votações, o ministro fica vencido em um. Mas
                menos o pior dos ministros que  essas derrotas nada têm de inglórias, e em muitos casos são prenún-
                                                     cios de futuras vitórias retumbantes. Como mostra o
                                                     juiz federal e ex-presidente da Ajufe, Fernando Mendes,
                                                     em artigo publicado na ConJur, em 2020: “Dos muitos
                NOME                                 temas que poderiam ser lembrados em que o voto diver-
                Marco Aurélio Mendes de              gente do ministro acabou, posteriormente, formando a
                Farias Mello                         posição majoritária, destacarei dois: o que reconheceu
                                                     a inconstitucionalidade da proibição da progressão de
                NASCIMENTO                           regime na Lei de Crimes Hediondos e o que impediu a
                12/7/1946, no Rio de Janeiro         execução da pena privativa de liberdade antes do trân-

                ÁREA DE ESPECIALIZAÇÃO               sito em julgado.”
                Direito Constitucional                 Estas duas derrotas que se solidificaram como vitó-
                                                     rias mostram uma outra marca indelével dos 31 anos
                POSSE 13/6/1990                      de atuação de Marco Aurélio no Supremo: a defesa sem
                APOSENTADORIA 5/7/2021               tréguas da Constituição da República: “Urge restabele-
                                                     cer a segurança jurídica, proclamar comezinha regra,
                NOMEAÇÃO Fernando Collor             segundo a qual, em Direito, o meio justifica o fim, mas

                ORIGEM Magistratura                  não o inverso. Dias melhores pressupõem a observância
                                                     irrestrita à ordem jurídico-normativa, especialmente a
                                                     constitucional. É esse o preço que se paga ao se viver



                                                                                           ANUÁRIO DA JUSTIÇA BRASIL 2021  51


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