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utilizam a fórmula “e congêneres” ENTENDIMENTO JURÍDICO
ou expressões como “de qualquer Prestador de serviço intelectual pode optar por atuar como pessoa jurídica? A pretensão reducionis-
natureza”, “de qualquer espécie” e ta de classificar a priori o vínculo jurídico mantido entre o tomador e o prestador dos serviços intelectuais,
“entre outros”. Em sua avaliação, aí incluídos os de natureza científica, artística ou cultural, em caráter personalíssimo ou não, perempto-
não há obstáculo constitucional a riamente negada qualquer possibilidade de subsunção dos fatos à norma, implica verdadeiro menoscabo
essa técnica legislativa e “excessos dos direitos fundamentais do trabalhador previstos no artigo 7º da Constituição Federal , com nítida chan-
interpretativos” do Fisco ou do cela de fraude à legislação trabalhista, no que manifestamente nega ao trabalhador questionar no Poder
contribuinte poderão ser solucio- Judiciário, órgão constitucionalmente competente, a definição da real configuração do vínculo jurídico
em que se deu a prestação dos serviços em ofensa aos artigos 5º, XXXV, e 114, I, da Constituição Federal.
nados pelo Poder Judiciário. (...) Nessa ordem de ideias, e considerada a complexa realidade cotidiana, a necessária equiponderância
Assim como o ministro Ricar- entre o exercício da liberdade econômica e o valor social do trabalho, à luz dos artigos 1º, IV, e 170 da
do Lewandowski, tem tomado Constituição Federal, como valor máximo do Estado Democrático para o desenvolvimento da ordem eco-
sucessivas decisões em ações que nômica e financeira, representa chave hermenêutica para a concretização da dignidade do trabalhador.
questionam a falta de ação do go- Diante dessa complexa relação entre força de trabalho e livre iniciativa na dinâmica da livre concorrência,
relatório organizado pelo professor Alain Supiot – encomendado pela Comissão Europeia sobre as Trans-
verno federal frente à epidemia formações do Trabalho – aponta para o recurso das empresas ao trabalhador autônomo sob duas estraté-
de Covid-19. “Não é constitu- gias: desvalorização ou valorização do trabalho: Desvalorização na hipótese em que é adotado o trabalho
cionalmente aceitável qualquer independente na gestão da empresa como artifício para afastar do direito do trabalho os trabalhadores
retrocesso nas políticas públicas não qualificados e em situação de precariedade. Aparece como via fraudulenta de desregulamentação
de saúde, como ocorre com o de- com a finalidade de escapar das restrições observadas pelas empresas concorrentes, principalmente em
créscimo no número de leitos de matéria de financiamento da proteção social. O tratamento formalmente igual de partes economicamente
tão distintas equivaleria a tornar o empregado um refém da vontade do seu empregador. O Direito do
UTI custeados pela União”, afir- Trabalho, mais uma vez, diferencia-se do Direito Civil clássico e assume o papel de compensador das desi-
mou em caso em que determi- gualdades, viabilizando o estabelecimento de uma relação equilibrada. (ADC 66)
nou o restabelecimento imediato A EC 33/2001 prevê como base de incidência das contribuições de intervenção no domínio econô-
de leitos de UTI destinados ao mico a folha de salários? A questão é extremamente sensível – não somente do ponto de vista jurídico,
tratamento de Covid-19 no Ma- como também do econômico –, a comportar distintas interpretações. (...) Contudo, assento, desde logo,
ranhão, em São Paulo e na Bahia. o entendimento de que o elenco da alínea “a” do inciso III do parágrafo 2º do artigo 149 da Constituição
“É de se exigir do governo federal Federal não é meramente exemplificativo mas, sim, taxativo, efetiva delimitação de estatura constitucio-
nal das bases materiais de incidência das contribuições interventivas e sociais gerais. (...) Esta corte, por
que suas ações sejam respaldadas ocasião do julgamento do RE 559.937, já teve a oportunidade de apontar para o caráter taxativo do rol
por critérios técnicos e científi- constante da alínea “a” do inciso III do parágrafo 2º do artigo 149 da Lei Maior, estando adstrito o legis-
cos, e que sejam implantadas as lador ordinário a observá-lo quando da instituição das espécies tributárias ali previstas. Assim, embora
políticas públicas, a partir de atos o regramento tributário seja informado por todos os vetores constitucionais que a Lei Maior contempla,
administrativos lógicos e coeren- incluídos os diversos comandos contidos em seu texto, uma vez delimitadas as bases materiais de incidên-
tes”, disse. Nas decisões em que cia das contribuições de intervenção no domínio econômico – pelo poder constituinte derivado –, descabe,
a meu juízo, emprestar interpretação extensiva à espécie, chancelando base de cálculo em desacordo
mandou o governo reabilitar lei- com o comando constitucional e, em última análise, a cobrança de tributo ao arrepio do ordenamento
tos em vários estados, afirmou jurídico. Essa, inegavelmente, é a conclusão que se amolda àquela já adotada por este Supremo Tribunal
que a condução da crise sanitária Federal no RE 559.937, quando do exame da contribuição para o PIS/Cofins-importação, reconhecida a
pelo governo federal tinha medi- complementaridade dos preceitos constitucionais (artigos 149 e 195), mas sem prejuízo da submissão ao
das erráticas, inócuas, de impro- rol da alínea “a”, implementado pela EC 33/2001. Compreender no sentido de que a EC 33/2001, ao con-
templar em sua redação o verbo no futuro (poderão), validando as contribuições anteriormente instituídas
viso e sem comprovação cientí- seria consagrar, de forma jurídica inadequada, a meu juízo, a convivência de espécies tributárias idênticas
fica. “O discurso negacionista é (contribuições de intervenção no domínio econômico) sob regimes tributários diversos, embora todas sob
um desserviço para a tutela da a égide de um só comando constitucional. No plano constitucional, a política de desoneração tributária
saúde pública nacional.” da folha de salários restou positivada com o advento da EC 33/2001, que delimitou as materialidades das
Ao assumir o comando dos contribuições sociais e interventivas gerais, restringindo-as ao faturamento, à receita bruta, ao valor da
trabalhos em sessão virtual de- operação e ao valor aduaneiro, com a óbvia exclusão da folha de salários. (RE 603.624)
pois que o presidente Luiz Fux
se ausentou para uma audiên- por compartilhar com vossas excelências este momento”, disse. An-
cia, tornou-se a terceira mulher tes dela, presidiram sessões plenárias do STF as ministras Cármen
a presidir os trabalhos da corte. Lúcia e Ellen Gracie (já aposentada). Deve assumir a Presidência
“Um nervosismo emocionado, como titular em setembro de 2022, mas não completará o mandato,
me sinto extremamente honrada já que se aposenta em outubro de 2023.
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