Page 84 - Processos e práticas de ensino-aprendizagem
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que  aos  poucos  foram  cedendo  espaços  para  a  curiosidade,  para  o  sentimento  de
               liberdade e o desenvolvimento das minhas traquinagens. Foram anos de uma infância

               muito feliz e cheia de aventuras infantis, sem dúvida! Eu conheci e amei cada pedacinho
               daquela  terra:  desde  os  riachos,  os  campos,  cada  animalzinho  que  nascia  e  que

               escolhíamos os nomes, cada ninho de passarinho descoberto, era sempre uma alegria!
               Eu vivia correndo, pois era muita vida para viver: pescar, subir em árvores, correr atrás

               dos  animais  no  pasto,  encontrar  frutas  maduras,  brincar  com  os  filhotes,  caçar
               borboletas  e  vaga-lumes,  fugir  de  corujas,  jogar  futebol  (sim,  também  é  coisa  de

               menina!), fantasiar mil aventuras naquele pequeno espaço-tempo, era mágico! Chinelos,
               para quê? Somente quando era obrigada a colocá-los para ir às missas de domingo, vez

               ou outra...
                      Claro que a data mais esperada, depois da Páscoa e da visita do Coelhinho, era o

               Natal, principalmente, porque era a época em que meus primos e primas, que moravam
               na cidade, vinham passar suas férias conosco. Nem vou me ater aqui e contar todas as

               brincadeiras e peripécias que fazíamos, mas certamente, fomos responsáveis por muitos
               dos cabelos brancos de minha mãe. Outro momento muito esperado, era quando eu

               ludibriava minha mãe, e sorrateiramente, ficava ouvindo os “causos e prosas” dos tios e
               tias, geralmente sobre as “visagens” da região, sobre os lobisomens e boitatás... E depois,

               de várias horas de ouvinte e com os pensamentos borbulhantes, onde eu guardava a
               coragem para ir dormir? Nem sei responder, meu caro leitor...

                      Passaram-se mais três anos e novamente o fantasma da “mudança” retornou, pois
               eu e meus irmãos já estávamos em idade escolar e nossos pais compreenderam que

               deveríamos voltar a morar na cidade. Aos seis anos, a dor da partida e do adeus já é mais
               bem  compreendida  pelo  coração  da  primeira  infância  e  apesar  dos  meus  inúmeros

               protestos, não teve jeito: a mudança aconteceu. A partir de então, a tristeza por deixar
               para trás aquele lugar que havia se tornado meu mundo incrível foi cedendo espaço para

               a curiosidade e para a imaginação de como seria um lugar chamado... escola!
                      Devo confessar que esse encantamento foi graças à minha mãe, que começou

               meu processo de alfabetização em casa e, quando descobri as primeiras letras, algo
               dentro de mim mudou para sempre: foi amor à primeira letra! Desvendar todos aqueles

               códigos e símbolos era uma aventura fantástica para mim e creio que ninguém mais do
               que eu, desejava tanto que as aulas começassem, mais do que a chegada do Natal!




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