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GRAMSCI E A RÚSSIA SOVIÉTICA | DOMENICO LOSURDO
modo ou de outro, soube assimilar a lição da dialética, mas justamente
em virtude de sua superior fineza e maturidade tal pensamento está em
condições de compreender as dificuldades e as razões da sociedade e da
história que expressaram o Diamat. A Rússia de Stálin precisa proceder
do mesmo modo que a Alemanha de Lutero.
6. “Linguagem esópica” e análise do “americanismo”
Mas se é assim, como explicar a intensa e prolongada atenção que,
a partir de 1929 – como demonstra uma carta a Tania, de 25 de março
daquele ano –, ele dispensa ao “americanismo” e ao “fordismo” ? O
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julgamento equilibrado, e às vezes positivo, exposto com tal propósito
pelos Cadernos do Cárcere, não é, ao contrário, a confirmação do crescen-
te desinteresse da parte do revolucionário na prisão pelo movimento
comunista? Um equívoco de fundo deturpa tal interpretação, além do
evidente desejo de adaptação ao clima ideológico hoje dominante, que
a inspira. Convém dizer de imediato que as páginas sobre “Americanis-
mo e Fordismo” falam não apenas dos Estados Unidos, mas também
da Rússia soviética, e talvez falem mais da Rússia soviética do que dos
Estados Unidos. A afirmação pode parecer paradoxal e até arbitrária;
então, só resta examinar os textos e o contexto histórico.
Comecemos pelo contexto. Vimos Pierre Pascal reverenciar a Re-
volução de Outubro como o advento de uma sociedade na qual exis-
tem “somente pobres e paupérrimos” e cuja nobreza moral consiste na
distribuição mais ou menos igualitária da miséria. Essa visão, marcada
pelo desinteresse pelo desenvolvimento das forças produtivas e da ri-
queza social, traduz um sentimento comum. Depois de sua viagem a
Moscou, Benjamin relata:
“Nem menos na capital da Rússia existe, malgrado
toda “racionalização”, o senso de um valor de tempo.
35 LC, p. 248.
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