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DOMENICO LOSURDO, 1941-2018 | STEFANO AZZARÀ
que decorre inevitavelmente da sua potência discursiva universalista.
Aliás, para a filosofia, o juízo político é o verdadeiro experimentum crucis
da razão. A capacidade de exercê-lo de forma correta pode, no limite,
mostrar a falsidade de filosofias inteiras e demonstrar a mesquinhez
das construções teóricas, mesmo as mais grandiosas.
Foi enorme, por exemplo, a profundidade filosófica de Nietzsche
perante os conflitos da sua época, ao revelar a hipocrisia dos sentimentos
morais e do espírito de progresso do seu tempo, por trás dos quais
se escondia uma forma diferente da vontade de poder, privada, no
entanto, da coragem e da boa consciência de quem sabe reconhecer
a necessidade da força e até da escravatura. Ou a de Heidegger, ao
denunciar no interior da metafisica subjetivista da modernidade e no
desenvolvimento da técnica e das forças produtivas capitalistas, um
projeto caracterizado pelo domínio. Ou ainda a lucidez de Schmidt, ao
especificar as aporias do pacifismo idealista wilsoniano e liberal, por
trás do qual, ainda nos nossos dias, paira a ideia de uma nova ordem
mundial tipicamente imperial, uma ordem que supera, numa direção
globalizante, qualquer localização e que já acabou com o ordenamento
eurocêntrico da terra, para substituí-lo por um ordenamento
diferente, mas não menos agressivo. Todavia, no momento em
que estes intelectuais de alta estatura foram postos, pelos próprios
acontecimentos, perante a necessidade de um juízo político, perante
a necessidade de tomar partido acerca do curso do mundo, eis que as
suas pretensões de transcendência filosófica foram imediatamente
quebradas. Às múltiplas contradições do universalismo, cuja explosão
anunciava, já então, a crise da modernidade, não conseguiram
contrapor nada mais do que uma miserável apologia do particularismo.
Por isto concluía Losurdo que, “apesar da sua radicalidade, e dos
resultados cognitivos excepcionais que permite conseguir”, a disrupção
desconstrutiva, ou seja, “a destruição das flores imaginadas” exercida
por estas célebres filosofias, acaba “por reforçar as cadeias não só da
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