Page 204 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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tomar pílulas abalou muita gente.
Ele não explicou por que um homem como Don Corleone achava incrível que uma pessoa
pudesse tentar o suicídio.
Agora, após quase 18 meses em Las Vegas, Lucy estava surpresa de ver-se quase feliz.
Algumas noites, sonhava com Sonny e, acordando antes do amanhecer, continuava pensando em
suas próprias recordações, até adormecer novamente. Desde então não tivera outro homem. A
vida em L.as Vegas era boa. Nadava nas piscinas do hotel, velejava no lago Mead e percorria de
automóvel o deserto no seu dia de folga. Emagrecera e isso lhe melhorara a silhueta. Ainda era
voluptuosa, porém mais americanizada do que no antigo estilo italiano. Trabalhava como
recepcionista na seção de relações públicas do hotel e nada tinha a ver com Freddie, embora,
quando ele a via, parasse para bater um papinho. Ficou surpresa com a transformação que
Freddie sofrera. Tornara-se um conquistador de mulheres, elegantemente vestido, e parecia ter
verdadeira vocação para dirigir uma estância de jogo. Controlava a parte do hotel, coisa que
geralmente não é feita pelos donos de cassino. Com o verão longo e muito quente, ou talvez em
virtude da sua vida sexual mais ativa, emagrecera, e o trajar à moda de Hollywood fê-lo parecer
muito jovial.
Seis meses depois, Tom Hagen veio ver como ia indo ela. Lucy recebia um cheque de
seiscentos dólares todos os meses, além do seu salário. Hagen explicou que se devia provar que
esse dinheiro provinha de alguma fonte; por isso, pediu-lhe que assinasse um documento,
outorgando-lhe procuração total, a fim de que ele pudesse encaminhar-lhe a importância
adequadamente. Informou-lhe ainda que, por uma questão de formalidade, ela seria possuidora
de 5% das ações do hotel em que trabalhava. Ela teria de satisfazer todas as formalidades
exigidas pelas leis de Nevada. Todas essas providências seriam tomadas por outras pessoas, a fim
de que ela tivesse o mínimo trabalho. Contudo, não deveria discutir com qualquer pessoa nada do
que ficara combinado entre eles, sem o consentimento dele. Lucy estaria protegida por todos os
meios legais, e o seu dinheiro todo mês estaria garantido. Se as autoridades ou qual quer órgão de
fiscalização do governo a interrogassem, simplesmente deveria encaminhá-los para o seu
advogado e ninguém a incomodaria mais.
Lucy concordou. Compreendeu o que estava acontecendo, mas não tinha objeções a fazer
contra aquilo para que estava sendo usada. Parecia um favor razoável. Mas quando Hagen lhe
pediu que mantivesse os olhos abertos com respeito ao hotel, e vigiasse Freddie e o patrão dele, o
homem que possuía e dirigia o hotel, como o maior acionista, ela respondeu:
— Ó Tom, você não vai querer que eu espione Freddie, vai?
Hagen sorriu.
— Don Corleone está preocupado com ele. Freddie está sendo companheiro constante de
Moe Green e queremos apenas garantir que ele não se envolva em complicações.
Não se interessou em explicar a ela que Don Corleone financiara a construção desse hotel no
deserto de Las Vegas não somente para proporcionar um abrigo para o filho, mas também para
fincar o pé na porta a fim de realizar operações maiores.
Foi pouco depois dessa entrevista que o Dr. Jules Segal veio trabalhar como médico do hotel.
Ele era muito magro, muito bonito e encantador, parecendo muito moço para ser médico, pelo
menos para Lucy. Conheceu-o quando lhe nasceu um calombo acima do pulso. Ficou
preocupada com isso alguns dias; então uma manhã foi ao conjunto de salas do médico no hotel.
Duas coristas estavam na sala de espera, conversando. Elas tinham a beleza loura cor de pêssego
que Lucy sempre invejara. Pareciam angelicais.
— Juro que se eu tomar outra dose deixo de dançar — falava uma das garotas.
Quando o Dr. Jules Segal abriu a porta do consultório para fazer entrar uma das garotas,
Lucy teve vontade de ir embora, e se fosse alguma coisa mais pessoal e mais séria, ela o teria
feito. O Dr. Segal usava calças e camisa esporte. Os óculos de aro de tartaruga melhoravam-lhe
o aspecto, o mesmo acontecendo com seu tranqüilo modo reservado, mas a impressão que ele
dava era informal, e como muita gente basicamente antiquada, Lucy não acreditava que
medicina e informalidade se combinassem.