Page 82 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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CAPÍTULO 9
    QUANDO MICHAEL CORLEONE entrou na cidade nessa noite, estava de ânimo abatido.
  Sentia  que  se  estava  envolvendo  no  negócio  da  Família  contra  a  própria  vontade  e  teve  um
  ressentimento contra Sonny por usá-lo mesmo para atender o telefone. Sentia um mal-estar por
  se  ver  dentro  dos  conselhos  da  Família  como  se  lhe  pudessem  confiar  absolutamente  tais
  segredos como assassinato. E agora, indo ao encontro de Kay, sentia-se culpado por ela também.
  Nunca fora completamente honesto com ela a respeito da família dele. Falara a Kay sobre os
  parentes, mas sempre com pequenas piadas e anedotas engraçadas que os faziam parecer mais
  com aventureiros num filme technicolor do que com o que eles realmente eram. E agora seu pai
  havia sido baleado na rua e seu irmão mais velho estava fazendo planos de assassinato. Isso era
  apresentar as coisas de maneira clara e simples, mas não era jamais como ele as contaria a
  Kay. Ele já dissera que o fato de seu pai ser baleado era como que um “acidente” e que toda a
  confusão  terminara.  Diabo,  parecia  que  a  coisa  apenas  começava.  Sonny  e  Tom  estavam
  enganados a respeito desse tal de Sollozzo, estavam ainda subestimando-o, embora Sonny fosse
  bastante esperto para sentir que havia perigo. Michael procurou pensar qual seria o trunfo que o
  turco  possuía.  Ele  era  evidentemente  um  homem  ousado,  um  homem  sagaz,  um  homem  de
  extraordinária força. Tinha-se de imaginar que ele viria com uma grande surpresa. Mas então
  Sonny e Tom, Clemenza e Tessio, todos tinham concordado que tudo estava sob controle e todos
  tinham  mais  experiência  do  que  ele,  Michael.  Ele  era  o  ”civil”na  guerra,  Michael  pensou
  ironicamente. E eles teriam de dar-lhe um bocado de medalhas melhores do que ganhara na II
  Guerra Mundial para fazê-lo alistar-se nesta.
    Pensando  nisso,  sentiu-se  culpado  por  não  nutrir  mais  compaixão  pelo  pai.  Seu  pai  fora
  baleado  inúmeras  vezes  e,  contudo,  de  um  modo  curioso,  Michael,  melhor  do  que  ninguém,
  compreendeu quando Tom disse que foi por uma questão de negócio, não um caso pessoal. Que
  seu pai tinha pago pelo poder que detivera durante toda a vida, o respeito que obtivera à força de
  to dos aqueles que o rodeavam.
    O que Michael desejava estava fora, fora de tudo isso, era dirigir a sua própria vida. Mas não
  podia libertar-se totalmente da família, enquanto a crise não terminasse. Tinha de ajudar na sua
  situação de “civil”. Com súbita clareza, compreendeu que estava aborrecido com o papel que lhe
  atribuíram,  o  de  não-combatente  privilegiado,  o  daquele  que  se  opõe  por  uma  questão  de
  escrúpulos de consciência. Esse o motivo por que a palavra “civil” estalava em sua cabeça de
  maneira tão irritante.
    Quando  chegou  ao  hotel,  Kay  estava  esperando  por  ele  no  saguão.  (Dois  homens  de
  Clemenza  haviam-no  conduzido  de  carro  até  a  cidade  e  o  deixaram  numa  esquina  próxima,
  depois de se terem assegurado de que não haviam sido seguidos.)
    Jantaram juntos e tomaram algumas bebidas.
    — A que horas você vai visitar seu pai? — perguntou Kay.
    Michael olhou o seu relógio.
    — O horário de visita termina às 8:30. Penso que irei depois que todos tiverem saído. Eles me
  deixarão subir. O velho tem um quarto particular e as suas próprias enfermeiras, assim poderei
  passar algum tempo com eles. Acho que papai não pode falar, nem mesmo saberá que estou lá.
  Mas preciso mostrar respeito.
    — Sinto tanta pena de seu pai — disse Kay calmamente — ele parecia um homem tão bom
  no casamento. Não acredito nas coisas que os jornais estão publicando sobre ele. Tenho a certeza
  de que a maior parte do que falam não é verdade.
    — Penso exatamente como você, Kay — declarou Michael muito delicadamente.
    Ele  estava  surpreso  por  se  achar  tão  reservado  com  Kay.  Amava-a,  confiava  nela,  mas
  jamais lhe contaria algo a respeito de seu pai ou da Família. Ela era uma estranha.
    — Quanto a você? — perguntou Kay. — Vai se envolver nessa guerra de quadrilhas de que
  os jornais estão falando com tanto estardalhaço?
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