Page 86 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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CAPÍTULO 10
O HOSPITAL ERA PEQUENO e dispunha apenas de uma entrada, Michael olhou pela
janela para a rua lá embaixo. Havia um pátio em curva com alguns degraus que davam para a
rua, na qual não havia nenhum carro.Quem quisesse penetrar no hospital teria de vir
forçosamente por essa entrada. Ele sabia que não tinha muito tempo, assim saiu correndo do
quarto, desceu precipitadamente os quatro pavimentos e atravessou as portas largas da entrada do
andar térreo. Olhando para o lado, viu o pátio das ambulâncias e aí não havia qualquer carro,
nem ambulância, estacionado.
Michael postou-se na calçada do lado de fora do hospital e acendeu um cigarro. Desabotoou
o paletó e ficou sob a luz de um poste de modo que se podiam ver suas feições. Um rapaz estava
vindo rapidamente da Nona Avenida, com um embrulho debaixo do braço. Usava uma túnica
militar e tinha uma enorme cabeleira preta. Michael notou que o rosto lhe era familiar, quando o
rapaz se aproximou da luz, mas não conseguiu reconhecê-lo. O rapaz, porém, parou em frente
dele e estendeu a mão, dizendo num sotaque italiano carregado:
— Don Michael, lembra-se de mim? Enzo, o ajudante de padeiro de Nazorine, o Paniterra;
o genro dele. Seu pai salvou a minha vida conseguindo que o governo me deixasse ficar aqui na
América,
Michael apertou-lhe a mão. Lembrava-se dele agora.
— Vim apresentar meus respeitos a seu pai — continuou Enzo. — Será que me deixarão
entrar no hospital tão tarde?
— Não, mas muito obrigado assim mesmo. Direi ao velho que você esteve aqui — disse
Michael, sorrindo e balançando a cabeça.
Um carro vinha fazendo barulho pela rua e Michael ficou em expectativa. Disse para Enzo:
— Saia daqui depressa. Pode haver barulho. Você não vai querer envolver-se com a polícia.
Ele viu o medo estampar-se no rosto do rapaz. Barulho com a polícia podia significar ser
deportado ou recusa de cidadania. Mas o rapaz ficou ali firme e sussurrou em italiano:
— Se houver barulho eu ficarei para ajudar. Devo muito ao Padrinho.
Michael ficou emocionado. Estava para dizer novamente ao rapaz que fosse embora, mas
então pensou, por que não deixá-lo ficar? Dois homens na frente do hospital podiam intimidar
qualquer bando de Sollozzo enviado para executar um trabalho. Deu um cigarro a Enzo e o
acendeu para ele. Os dois estavam sob o poste de iluminação na noite fria de dezembro. As
vidraças amarelas do hospital, bifurcadas pelas decorações verdes de Natal, cintilavam neles.
Haviam quase acabado de fumar os cigarros, quando um carro preto comprido e baixo virou na
Rua 30 vindo da Nona Avenida, e cruzou na direção deles, muito perto do meio-fio. Quase parou.
Michael olhou para dentro do veículo na tentativa de ver o rosto dos ocupantes, com o corpo
recuando involuntariamente. O carro parecia que ia parar, mas acelerou a marcha novamente.
Alguém o reconhecera. Michael deu outro cigarro a Enzo e notou que as mãos do padeiro
tremiam. Para sua surpresa, as suas próprias mãos estavam firmes.
Permaneceram ali na rua, fumando por cerca de dez minutos, quando o ar da noite foi
cortado por uma sereia da polícia. Um carro-patrulha fez uma curva estridente vindo da Nona
Avenida e parou em frente ao hospital. Dois outros carros da polícia vieram logo atrás. De
repente, a entrada do hospital estava apinhada de policiais uniformizados e detetives. Michael
soltou um suspiro de alívio. O bom Sonny devia ter tomado as necessárias providências. Deu uns
passos à frente para ir ao encontro deles.
Dois polícias enormes e robustos agarraram-lhe os braços. Outro o revistou. Um volumoso
capitão da polícia, com galão dourado no quepe, veio subindo a escada, seus homens separando-
se, respeitosamente, para abrir caminho. Era um camarada vigoroso e ágil, apesar do cabelo
branco que o quepe não podia esconder. O seu rosto era avermelhado. Aproximou-se de Michael
e falou asperamente: