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O PROJETO DE EDUCAÇÃO PATRIMONIAL
Tratava-se, então, de um projeto mais direcionado para o desenvolvimento satisfatório seria necessário ter
e ambicioso, que tinha em vista o desenvolvimento os imóveis nas mãos da iniciativa privada, que, gerando
econômico, com base no turismo e no lazer. Nesse lucros, ressarciria o Estado. É nesse momento, e com o
contexto, o poder público não omitiu a necessidade único propósito de reocupação pela iniciativa privada,
de preservar o acervo cultural de forma “histórico- que o Programa parte para a chamada “negociação
estética”, e teceu considerações sobre o que chamava padrão” com os moradores, promovendo-se a política da
de “condições sub-humanas” da vida de sua população. exclusão que ignorou, equivocadamente, o espaço de
Mas não assumiu sua própria responsabilidade e a de convívio dos sujeitos históricos, possuidor de vitalidade,
seus representantes pela omissão que levou a tal estado conforme menção abaixo:
de coisas.
se o proprietário possuísse dois imóveis, por exemplo,
Na década de 1990, a diretoria geral do Ipac tinha o doava um ao estado e recebia o outro recuperado;
Centro Histórico como um caso grave e, para ela, “casos quando só possuísse um imóvel, o dono cedia a sua
graves e extremos necessitam de intervenções radicais, posse em comodato por um período de 10 anos e, ao
objetivas, que estabeleçam as condições de sobrevida, fim deste prazo, o imóvel lhe seria devolvido; houve
em todas as suas funções” (Programa de Recuperação, ainda casos de desmembramento da propriedade,
1995, p. 12). de compra e, quando não houve possibilidade de
acordo, umas poucas desapropriações (Programa de
O Programa de Recuperação, realizado a partir de
recuperação, 1995, p. 20).
1992, foi dividido inicialmente em quatro etapas, e,
assim como projetos anteriores para a localidade, Uma vez que o patrimônio cultural foi entendido
não incluiu de forma responsável os moradores apenas como “pedra e cal”, a população, estigmatizada,
como agentes vivos e “engrenadores” das melhorias e aos poucos perdeu o direito de propriedade e sua
de seus futuros benefícios. A questão é que o Programade identidade.
Recuperação tinha que ser iniciado, e trazia como questão
De forma incoerente, foi difundida a ideia de que os
fundamental a requalificação/reocupação da área.
moradores poderiam retornar ao Pelourinho após as
A requalificação proposta pelo Governo do Estado da obras de recuperação. No entanto, era sabido que
Bahia, com seu Plano de Ação Integrada, não deixou seriam desestimulados por uma série de fatores que
clara a manutenção dos moradores, considerando redundariam em elevação do custo de vida: impostos
que estes eram “segmentos considerados problema mais altos, despesas com a conservação dos casarões
na escala de valores sociais dominantes.” (Programa tombados e outros – gastos incompatíveis com o padrão
de Recuperação, 1995, p. 20). Com base nesse tipo de de renda daquela comunidade. O efeito da “negociação”
argumentação, tudo levou a uma espécie de “assepsia foi colocar para a população a opção de sair ou ficar
social”, que acabou por afastar os moradores de seus no Centro Histórico, conforme consta no Programa de
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imóveis. Até porque, seguindo os critérios do Programa, Recuperação (1995, p. 21):
ArqueologiA no Pelourinho