Page 61 - O Que Faz o Brasil Brasil
P. 61

certamente implica — como todo evento especial —, mas que ficam

                  necessariamente excluídos de sua definição. De fato, conforme
                  sabemos como brasileiros, o carnaval não pode ser sério. Senão não

                  seria um carnaval...

                         Mas como definir o carnaval? Não seria exagero dizer, é uma

                  ocasião em que a vida diária deixa de ser operativa e, por causa

                  disso, um momento extraordinário é inventado. Ou seja: como toda
                  festa, o carnaval cria uma situação em que  certas  coisas  são

                  possíveis e outras devem ser evitadas. Não posso realizar um carnaval

                  com tristeza, do mesmo modo que não posso ter  um funeral com

                  alegria. Certas ocasiões sociais  requerem  determinados  sentimentos
                  para que possam ocorrer como tais. Tragédias são definidas como

                  eventos tristes e tudo que nelas ocorre de cômico deve ser inibido ou

                  simplesmente ignorado. Carnavais e comédias, ao contrário, são

                  episódios em que o triste e o trágico é que devem ser banidos do
                  evento, como as roupas do rei que estava nu e não podia ser visto

                  como tal...

                         Mas como é que o povo define e vê o Brasil no carnaval? Qual a

                  receita para o carnaval brasileiro?

                         Sabemos que o carnaval é definido como “liberdade” e como
                  possibilidade de viver uma ausência fantasiosa e utópica de miséria,

                  trabalho, obrigações, pecado e deveres. Numa palavra,  trata-se  de

                  um momento onde se pode deixar de viver a vida como fardo e

                  castigo. É, no fundo, a oportunidade  de fazer tudo ao contrário:

                  viver e ter uma experiência do mundo como excesso — mas agora
                  como excesso de prazer, de riqueza  (ou de “luxo”, como se fala no

                  Rio  de  Janeiro),  de  alegria e de riso; de prazer sensual que fica —

                  finalmente — ao alcance de todos. A “catástrofe” que o carnaval

                  brasileiro possibilita é a da distribuição teórica do prazer sensual para
                  todos. Tal como o desastre distribui o malefício ou a infelicidade para

                  a sociedade, sem escolher entre ricos e pobres, como  acontece
   56   57   58   59   60   61   62   63   64   65   66