Page 143 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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compreendida como uma tutela contra a probabilidade do dano, mas sim como uma tutela contra o perigo da prática, da repetição ou da
continuação do ilícito, compreendido como ato contrário ao direito que prescinde da configuração do dano” (Luiz Guilherme Marinoni,
Tutela contra o ilícito, p. 65).
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Para evidenciar que o dano não é elemento constitutivo do ilícito, argumentou-se que, quando se diz que não há ilícito sem dano,
identifica-se o ato contraius com aquela que é a sua normal consequência, e isto ocorreria apenas porque o dano é o sintoma sensível da
violação da norma. A confusão entre ilícito e dano seria o reflexo do fato de que o dano é a prova da violação e, ainda, do aspecto de que
entre o ato ilícito e o dano subsiste frequentemente uma contextualidade cronológica que torna difícil a distinção dos fenômenos, ainda
que no plano lógico. Ver Eduardo Bonasi Benucci, Atto illecito e concorrenza sleale, RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, p. 569.
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Michele Mòcciola, Problemi del risarcimento del danno in forma specifica nella giurisprudenza, RivistaCriticadelDirittoPrivato, p. 380-381.
Ver Michele Giorgianni, Tutela del creditore e tutela “reale”, RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, 1975, p. 853 e ss; Renato
Scognamiglio, Il risarcimento del danno in forma specifica, RivistaTrimestralediDirittoeProceduraCivile, 1957, p. 201 e ss.
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O art. 84 do CDC tem grande semelhança com o art. 536, do CPC, dispondo no seu caput que, “na ação que tenha por objeto o cumprimento
da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o
resultado prático equivalente ao do adimplemento”. Esse artigo está inserido no sistema de tutela coletiva dos direitos, integrado,
fundamentalmente, pela Lei da Ação Civil Pública e pela parte final do Código de Defesa do Consumidor. De modo que o art. 84 do CDC
constitui a base de qualquer ação voltada à tutela específica dos direitos difusos e coletivos.
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Note-se que o arresto, por exemplo, difere nitidamente da tutela inibitória, já que não exerce função inibitória, mas destina-se a assegurar
a efetividade da tutela ressarcitória. Ou seja, há uma nítida diferença entre a tutela inibitória e a tutela que visa a dar segurança a um
direito que já foi violado. Na verdade, e para irmos um pouco mais além, parece mais exato afirmar que a tutela cautelar, além de ter por
fim assegurar a efetiva tutela de um direito já violado, pode ter por escopo assegurar um direito para a hipótese de ele ser violado. Basta
pensar nos casos em que a caução cautelar pode ser utilizada para assegurar ao autor a efetividade da eventual (e aí não necessária)
tutela ressarcitória, que poderá ser requerida se o direito (que apenas se teme ver violado) for realmente lesado. Da mesma forma que a
condenação para o futuro – que, por pressupor a violação do direito, não tem natureza preventiva (apesar da expressa discordância de
Calamandrei, que afirma que a condenação para o futuro constitui o casomásnotorio de tutela preventiva) –, a caução que visa a
assegurar uma eventual e futura tutela ressarcitória também não pode deixar de ser diferenciada da tutela inibitória. Tanto a tutela que
visa a assegurar a efetividade da tutela de um direito que já foi violado, quanto a tutela que objetiva assegurar um direito para a hipótese
de ele ser violado, têm natureza acautelatória, ou seja, de segurança que não se dirige a impedir a violação do direito, mas sim a garantir
o direito na suposição de que ele, após ter sido violado, poderá não ser efetivamente tutelado.
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Adolfo Di Majo, um importante civilista italiano, deixa bem clara a idéia de que a tutela cautelar não foi pensada para exercer a função
hoje reservada para a inibitória. Segundo Di Majo, para a obtenção de tutela cautelar nem mesmo seria suficiente afirmar a ocorrência de
uma violação de direito, sendo necessário demonstrar que esta violação, com o transcurso do tempo, causaria um dano iminente. Disse
ele: “... a tutela ex art. 700, CPC, que por outro lado se insere em um discurso mais vasto em relação às medidas que têm caráter cautelar,
pressupõe que uma violação (a direitos de propriedade, a direitos da pessoa, ou também a direitos relativos) já tenha ocorrido, e não ainda
que seja simplesmente objeto de ameaça ou que em relação a ela existam indícios” (Adolfo di Majo, La tutela civile dei diritti, Milano:
Giuffrè, 1993, p. 144).
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Lodovico Barassi afirmou que a “tutela puramente preventiva”, “certamente la più energica”, seria também “la più preoccupante, come è
di tutte le prevenzioni che possono eccessivamente limitare l’umana autonomia” (Lodovico Barassi, Lateoriageneraledelleobbligazioni,
Milano: Giuffrè, 1964, p. 428). A ideia de que a tutela inibitória encontra obstáculo na liberdade do homem guarda raízes em princípios
próprios do direito liberal clássico, os quais não podem servir para inspirar uma doutrina que vive em um outro Estado, sob diversos
valores e em uma diferente época. A tutela preventiva, como já foi dito, é fundamental para a efetividade de direitos muito importantes
dentro do contexto do Estado atual.
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Ovídio Baptista da Silva, Processo e ideologia, Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 123.