Page 8 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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Não se quer dizer que a jurisdição, na tutela dos direitos fundamentais, apenas apareça no caso
                  de omissão de tutela do legislador. O que realmente aqui importa é que a compreensão de tutela
                  jurisdicional  dos  direitos  exige  esforço  e  concentração  no  plano  do  significado  das  normas.  As
                  normas de proteção de direitos fundamentais, como os do consumidor e ao meio ambiente sadio,
                  não  são  atributivas  de  direitos,  mas  impositivas  ou  proibitivas  de  condutas,  partindo  da
                  consideração de que determinadas condutas devem ser impostas ou proibidas para que os direitos
                  fundamentais  sejam  tutelados.  Portanto,  tais  normas,  quando  violadas,  não  exigem  as  formas  de
                  tutela  que  costumam  ser  dadas  ao  cidadão  diante  do  ilícito  danoso.  Como  é  evidente,  a  simples
                  exposição à venda de produto nocivo à saúde não dá a consumidor algum o direito de pedir tutela
                  jurisdicional  ressarcitória.  A  única  forma  de  tutela  jurisdicional  que  se  pode  ter  na  hipótese  de
                  violação de norma de proteção é exatamente aquela que, de forma similar ao que acontece no plano
                  administrativo,  impõe  a  observância  da  norma  ou  remove  os  efeitos  concretos  derivados  da  sua
                  violação. Ora, qual seria a forma de tutela jurisdicional diante da violação de norma de proteção a
                  direito  fundamental  senão  aquela  capaz  de  fazer  valer  o  próprio  desejo  da  norma  descumprida?
                  Nesse  caso,  a  forma  de  tutela  decorre  da  própria  natureza  da  norma  violada.  A  violação  exige  a
                  atuação da norma, e não um remédio capaz de garantir proteção ao sujeito que sofreu dano, isto é, a
                  tutela ressarcitória.

                     Isso não significa que a violação de norma de proteção não possa acabar acarretando danos aos
                  cidadãos ou mesmo a direitos transindividuais, como o direito ambiental. Nesse caso há duas formas
                  de tutela ressarcitória: pelo equivalente e na forma específica. Quando não há alternativa senão a
                  consideração  do  valor  do  dano  em  dinheiro  ou  quando  o  cidadão  prefere  o  ressarcimento  em
                  pecúnia ainda que seja possível a tutela específica, impõe-se a tutela jurisdicional ressarcitória pelo
                  equivalente.  No caso de direito transindividual, sendo faticamente viável a reparação in natura, a
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                  tutela ressarcitória deve ser prestada na forma específica. 5

                     Como  se  vê,  o  Estado  tem  o  dever  de  tutelar  ou  proteger  os  direitos  fundamentais  através  de
                  normas,  da  atividade  administrativa  e  da  jurisdição.  Por  isso,  há  tutela  normativa,  tutela
                  administrativa e tutela jurisdicional dos direitos.

                     A jurisdição tem o dever de proteger ou tutelar todos os direitos, sejam fundamentais ou não.
                  Porém, dizer que a jurisdição deve atender ao direito material pode significar, simplesmente, que o
                  processo  deve  acudir  aos  direitos  atribuídos  aos  cidadãos  pelas  normas  materiais,  o  que  não
                  expressa algo muito relevante, a não ser um clichê que vem sendo utilizado pelos processualistas
                  para  dizer  algo  que  é  correto,  porém  óbvio  e  destituído  de  importância,  especialmente  quando  se
                  almeja uma dogmática capaz de permitir a efetiva retomada dos laços entre o processo civil e o direito
                  material.

                     Esse  clichê  pode  ser  identificado  no  ditado  de  Chiovenda,  hoje  celebrizado  pela  doutrina
                  processual, segundo o qual “o processo deve dar a quem tem um direito tudo aquilo e exatamente
                  aquilo que tem o direito de obter”. Além de Chiovenda não ter construído essa frase com a mesma boa
                  vontade  e  intenção  dos  processualistas  que  a  repetem, ela  é  insuficiente  para  identificar  uma
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                  dogmática adequada aos nossos dias.
                     A preocupação com a tutela dos direitos não diz respeito apenas à idoneidade do processo para
                  atender aos direitos, pois é uma questão que se coloca, já em um primeiro momento, no âmbito do
                  direito  material.  E,  no  plano  do  direito  material,  implica  a  adoção  de  uma  postura  dogmática  que
                  retira o foco das normas ditas atributivas de direitos para jogar luz sobre a esfera das tutelas, local em
                  que se encontram as formas de tutela ou de proteção que os direitos reclamam quando são violados ou
                  expostos a violação. 7
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