Page 9 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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As formas de tutela são garantidas pelo direito material, mas não equivalem aos direitos ou às
suas necessidades. É possível dizer, considerando-se um desenvolvimento linear lógico, que as
formas de tutela estão em um local mais avançado: é preciso partir dos direitos, passar pelas suas
necessidades, para então encontrar as formas capazes de atendê-las.
Assim, por exemplo: a Constituição Federal afirma que “são invioláveis a intimidade, a vida
privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação” (art. 5.º, X), e que “é assegurado o direito de resposta, proporcional
ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem” (art. 5.º, V). Nesse caso, a
Constituição garante de maneira expressa várias formas de proteção ou de tutela aos direitos à
intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas. 8
Ou seja, tais normas não se limitam a atribuir ou a proclamar direitos, mas consideram as suas
necessidades e afirmam as formas imprescindíveis à sua proteção. Quando a Constituição diz que tais
direitos são invioláveis, afirma que eles exigem uma forma de proteção jurisdicional capaz de
impedir a sua violação. Mas, além disso, confere a tais direitos, no caso de violação, indenização,
deixando claro que eles devem ser protegidos ou tutelados mediante ressarcimento nos casos de
dano material e moral.
Perceba-se, porém, que a primeira parte do inciso V do art. 5.º, ao dizer que “é assegurado o
direito de resposta, proporcional ao agravo”, garante uma forma de proteção ao direito que não se
confunde com a inibitória ou com a ressarcitória pelo equivalente. Trata-se da tutela ressarcitória na
forma específica, já que destinada a reparar o dano de modo específico, e não mediante o
pagamento do equivalente em dinheiro ao seu valor. 9
Como se vê, a postura dogmática preocupada com as tutelas é atenta para as formas de proteção
ou de tutela dos direitos. Ela não está preocupada em saber se os cidadãos têm este ou aquele direito,
ou mesmo com a identificação de direitos difusos e coletivos. É que, na perspectiva das “formas de
tutela dos direitos”, a atribuição de titularidade de um direito fica na dependência de que lhe seja
garantida a disponibilidade de uma forma de tutela que seja adequada à necessidade da sua
proteção. Ou melhor, o sujeito só é titular de um direito, ou de uma posição juridicamente protegida,
quando esse direito dispor de uma forma de tutela adequada à necessidade de proteção que esta
posição exija. Como está claro, há aí um proposital desvio de rota dirigido a permitir a
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diferenciação entre a atribuição – ou, como dizem alguns, a proclamação – de direitos e a existência de
“posições jurídicas protegidas”.
Note-se que ter direito à imagem é algo muito diferente do que ter uma forma de tutela adequada
à sua proteção, como a tutela inibitória. Ter direito ao meio ambiente sadio não quer dizer ter
direito à tutela ressarcitória na forma específica. O direito do consumidor deve ter ao seu dispor a
tutela capaz de remover os efeitos concretos derivados do ato que violou a norma de proteção, e
assim por diante.
Ademais, a questão das formas de tutela, por dizer respeito ao plano do direito material, não deve
se confundir com o problema de se saber se o processo civil é capaz de dar efetividade aos direitos,
ou melhor, às formas de tutela prometidas pelo direito material. Pergunta-se sobre as formas de
tutela na esfera do direito material, portanto, antes de se analisar a efetividade do processo. Aliás,
caso a questão das “formas de tutela” pudesse ser confundida com a da “efetividade do processo”,
estaria negada a obviedade de que a pergunta sobre a forma de tutela é um degrau que
necessariamente deve ser ultrapassado para se chegar à problematização da efetividade do processo.