Page 10 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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3. Técnica processual e tutela dos direitos
O processo deve se estruturar de maneira tecnicamente capaz de permitir a prestação das formas
de tutela prometidas pelo direito material. De modo que entre as tutelas dos direitos e as técnicas
processuais deve haver uma relação de adequação. No entanto essa relação de adequação não
pergunta mais sobre as formas de tutela, mas a respeito das técnicas processuais.
Quando se indaga sobre a efetividade do processo já se identificou a forma de tutela prometida
pelo direito material, restando verificar se as técnicas processuais são capazes de propiciar a sua
efetiva prestação. Não é por outro motivo que não se pode misturar tutela inibitória com sentença
mandamental ou tutela ressarcitória pelo equivalente com sentença condenatória. Também por essa
razão não há como deixar de constatar que a tutela antecipada não é uma técnica processual, mas a
antecipação da forma de tutela capaz de atender ao direito material. Na realidade, como agora é
fácil perceber, há uma técnica para a antecipação da tutela. Assim como a sentença e os meios
executivos servem para viabilizar a tutela final, a decisão antecipatória e os meios executivos a ela
adequados têm o objetivo de permitir a antecipação da tutela.
Ao se propor o binômio técnica processual-tutela dos direitos não se quer simplesmente reafirmar
a velha história da necessidade de adequação do processo ao direito material. Deseja-se, isto sim, a
partir de uma postura dogmática preocupada com as posições jurídicas protegidas e com as formas
de tutela necessárias para lhes dar proteção – e não mais apenas com as normas atributivas de
direitos –, chegar a uma verdadeira análise crítica da ação e do processo, mediante a verificação da
idoneidade das técnicas processuais para prestar as formas de tutela prometidas pelo direito
material.
Deixa-se claro que o significado de “técnica”, aqui empregado, está muito longe daquele que se
costuma atribuir à “técnica” despreocupada com a realidade da vida. Ao se falar em técnica
processual, não se pretende – nos termos das teorias ditas tecnicistas – elaborar um sistema imune
ou neutro, como se o processo civil não fosse destinado a atender aos conflitos dos homens de carne
e osso. Ao inverso, a única razão para relacionar a técnica processual e as tutelas dos direitos é
demonstrar que o processo não pode ser pensado de forma isolada ou neutra, pois só possui sentido
quando puder atender às tutelas prometidas pelo direito material, para o que é imprescindível
compreender a técnica processual (ou o processo) a partir dos direitos fundamentais e da realidade
do caso concreto. De modo que, ao contrário das doutrinas e dos sistemas desprovidos de paixão
pelo homem e pela vida, e que procuram encontrar sustentação em conceitos abstratos que tanto
são melhores quanto mais “limpos e transparentes” – isto é, neutros –, a presente teoria não tem
outra preocupação a não ser evidenciar a falácia da teoria processual clássica, que ignorava a
própria razão de ser do processo civil.
4. A técnica da cognição e a construção de procedimentos diferenciados
A técnica da cognição permite a construção de procedimentos ajustados às reais necessidades de
tutela. A cognição pode ser analisada em duas direções: no sentido horizontal, quando a cognição
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pode ser plena ou parcial; e no sentido vertical, em que a cognição pode ser exauriente, sumária e
superficial.
4.1. A técnica da cognição parcial
O legislador, através da técnica da cognição parcial, pode desenhar procedimentos reservando
determinadas exceções, que pertencem à situação litigiosa, para outros procedimentos; nos