Page 90 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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mas sim o direito à sua execução e obtenção, não há como não admitir o emprego da multa como meio
                  coercitivo. Aliás, a possibilidade do uso da multa também é decorrência da possibilidade do uso da
                  coerção  pessoal.  Ora,  o  autor  não  apenas  pode,  mas  na  verdade  deve  usar  meio  executivo  menos
                  agressivo quando igualmente idôneo. A multa, por constituir meio idôneo e que gera menor restrição
                  ou gravame, sempre deve ser aplicada antes da prisão, sob pena de violação à regra da necessidade,
                  sub-regra da regra da proporcionalidade. 209

                     A tese que discrimina o credor de alimentos indenizativos, ilógica e distante da realidade social,
                  certamente não pode ser admitida pelo juiz atento à razão de ser da tutela antecipada. Todos os que
                  conhecem  a  realidade  da  prática  forense  sabem  que  os  réus  de  ações  de  ressarcimento,
                  principalmente quando o autor é economicamente frágil, valem-se da demora do processo para obter
                  vantagens econômicas. De fato, o autor, nestas ações, não raramente é obrigado a abrir mão de parte
                  do seu direito apenas por não poder suportar a lentidão da justiça, a qual lamentavelmente costuma
                  ser lembrada para a obtenção de acordos corriqueiros na prática forense, mas imorais.
                       9.5.3.4.  A  execução  da  tutela  antecipada  de  soma  em  dinheiro,  na  ação  de
                    ressarcimento, admite a expropriação de bem sem a prestação de caução

                     Partindo-se  da  premissa  de  que  a  multa  e  a  prisão  se  mostraram  insuficientes,  suponha-se  a
                  penhora de bem imóvel do demandado. Seria possível a sua alienação? Com a dispensa da caução? A
                  impossibilidade da antecipação do pagamento de soma em dinheiro, como é sabido, pode ocasionar
                  prejuízo irreversível ao autor. Assim, negar ao juiz a possibilidade de alienação é o mesmo que obrigá-
                  lo a assistir a uma lesão a um direito. 210
                     O  cumprimento  provisório  da  sentença  autoriza  “o  levantamento  de  depósito  em  dinheiro  e  a
                  prática de atos que importem transferência de posse ou alienação de propriedade ou de outro direito
                  real, ou dos quais possa resultar grave dano ao executado”, desde que prestada “caução suficiente e
                  idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos” (art. 520, IV, CPC). Assim, como a
                  efetivação da tutela antecipada se submete ao regime do cumprimento provisório da sentença, é certo
                  que,  para  a  efetivação  da  tutela  antecipada,  é  possível  alienar  bem  de  propriedade  do  demandado.
                  Não obstante, como aquele que necessita de tutela antecipada de soma está em situação incompatível
                  com a prestação de caução, essa pode ser dispensada nos termos do art. 521, I e II, que expressamente
                  prevê a sua inexigibilidade quando i) o crédito for de natureza alimentar, independentemente de sua
                  origem ou ii) o credor demonstrar situação de necessidade.

                     Como se vê, se é possível a expropriação de bem antes de findo o processo, mesmo na execução da
                  tutela antecipada (arts. 297, parágrafo único e 520, IV, CPC), também não se discute que a caução pode
                  ser  dispensada  —  seja  para  o  levantamento  de  dinheiro,  seja  para  a  prática  de  atos  que  importem
                  alienação  de  propriedade  —  nos  casos  de  verba  de  natureza  alimentar  ou  quando  o  exequente  se
                  encontrar em estado de necessidade.

                     O código de 2015 corretamente deixou de relacionar a dispensa da caução com o valor do crédito
                                         o
                  postulado. O art. 475-O, § 2 , I, do código de 1973 afirmava que a caução apenas podia ser dispensada
                  “até o limite de sessenta vezes o valor do salário mínimo”. Contudo, como foi dito para contestar tal
                  limitação à época do código revogado, “se a necessidade importar soma superior a sessenta salários
                  mínimos e isto restar devidamente demonstrado, não há como obrigar o exequente a prestar caução
                  para ter o seu direito realizado, sob pena de se discriminar aquele que possui maior necessidade de
                  verba alimentar. Ora, a ideia de dispensar a caução não tem relação com o valor da soma, mas com a
                  necessidade do exequente, que pode ser de vinte ou até mesmo de oitenta salários mínimos – no caso
                  em que, por exemplo, é necessária uma operação cirúrgica”. 211
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