Page 473 - CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
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CURSO COMPLETO DE DIREITO AGRÁRIO, Silvia C. B. Opitz e Oswaldo Opitz, Ed. Saraiva, 7ª ed., 2013
8. Contrato de cambão
Pela sua originalidade, trataremos agora do contrato agrário denominado
"cambão", que não se deve confundir com o "puxirão", que é a reunião de lavra-
dores de uma região ou localidade, que se prestam a auxiliar um vizinho num tra-
balho agrícola, porque este não é condenado, enquanto aquele é de juridicidade
duvidosa.
O cambão é uma sobra direta da escravidão, ainda em pleno vigor no Nordeste.
Denomina-se "cambão" o contrato hoje inominado, pelo qual o proprietário presta
o uso de uma fração de terra ao cultivador mediante a contraprestação de um ou
mais dias de trabalho, por mês ou semana, a que este último fica obrigado, mas em
área diferente da de que recebeu o uso. Subsiste consuetudinariamente no "cambão"
a antiga figura dos serviços pessoais como contraprestação do aforamento - os
opressivos serviços pessoais, abolidos em Portugal na primeira metade do século
XIX e, segundo Teixeira de Freitas, nunca admitidos no Brasil, "para que tivéssemos
necessidade de os abolir".
Antonio Callado, em O despertar nordestino, nos dá um exemplo desse con-
trato: "José Daniel trabalha para o proprietário Pinto do Rego, sem nada pagar
pelo seu sítio de um quadro de terra, ou cerca de um hectare. Não paga nada, só
paga quatro dias por semana de cambão, de trabalho que dá de graça ao proprie-
tário. O hectare de terra, naquela zona, vale de dez a, no máximo, quinze mil
cruzeiros. Trabalhando quatro dias de graça por semana, José Daniel dá ao seu
senhor duzentos e oito dias, por ano, de trabalho gratuito. Se alguém no Nordeste
pagasse o salário mínimo de cem cruzeiros por dia, José Daniel, no fim de um ano,
teria comprado sua terra quase duas vezes". Assim, na prática, é o cambão (Ruy
Cime Lima, A propriedade e sua distribuição, p. 11). O ET condena este tipo de
contrato agrário.
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