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“Hoje acredito que, ao cometer um crime terrível, Wolfgang Priklopil queria apenas criar
seu próprio mundinho perfeito, com uma pessoa que estivesse ali só para ele. Provavelmente
ele nunca teria podido fazer isso do jeito normal e decidira, assim, forçar e modelar alguém
para isso. Em essência, ele não queria nada mais do que as outras pessoas: amor, aprovação,
calor. Queria alguém para quem ele fosse a pessoa mais importante do mundo. Ele parecia
não ter visto outro modo de conseguir isso senão sequestrando uma menina tímida de dez
anos e a afastando do mundo exterior, até que ela estivesse tão psicologicamente alheia que
ele pudesse ‘recriá-la’. (...)
Ele precisava daquele crime insano para concretizar sua visão de um mundo perfeito e
intacto. Mas, no fim, realmente queria apenas duas coisas de mim: aprovação e afeto. Como
se o objetivo por trás de toda aquela crueldade fosse forçar uma pessoa a amá-lo
incondicionalmente.”
As torturas se intensificaram justamente quando Priklopil percebeu que, apesar de tirar-
lhe o espelho para que não tivesse nenhuma imagem de si, batizá-la com um novo nome e
proibi-la de pronunciar o antigo, ele não conseguia dobrar Natascha. E a vida idílica que
esperava ter com sua mulherzinha/escrava dentro de casa, longe dos olhos do mundo, era
impossível. Era impossível especialmente para ele, que se tornava cada vez mais temeroso
do mundo lá fora. E mais desesperado com o de dentro, onde a menina crescia e se tornava
mulher, algo com que ele nunca tinha lidado muito bem.
“Se eu tivesse apenas o odiado, esse ódio teria me consumido e me tirado a força de que
eu precisava para sobreviver. Como naquele momento pude captar um lampejo do ser
humano pequeno, desorientado e fraco por trás da máscara do sequestrador, pude me
aproximar dele. Então, olhei em seus olhos e disse:
— Eu perdoo você, porque todo mundo erra às vezes.
Foi um passo que pode parecer estranho e doentio para muitas pessoas. Afinal de contas,
o ‘erro’ dele custara minha liberdade. Mas era a única coisa a fazer. Eu tinha de conseguir
conviver com aquele homem, caso contrário não sobreviveria.”
Em vários momentos do livro, Natascha mostra como o perdão tornou-se um instrumento
poderoso nessa relação delicadíssima, em que o sequestrador tinha literalmente a vida dela
nas mãos. Perdoar a tornava potente — e não apenas passiva. Alterava o equilíbrio de forças
entre os dois. Ela passou oito anos e meio recusando-se a chamá-lo de “mestre” e a ajoelhar-
se diante dele, mesmo que fosse espancada por isso.
O confronto de Natascha com o mundo de fora é revelador menos da vítima e do
sequestrador — mais da sociedade, de nós. Imagine a cena. Ela corre para longe do
sequestrador, depois de mais de oito anos de cativeiro. Diz às primeiras três pessoas que
encontra, uma criança e dois homens adultos: “Vocês têm de me ajudar! Preciso de um