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matando cinco pessoas na vida real, bem aqui na rua, agora, você não sentiria nada? Ou isso
marcaria a tua vida para sempre?”. Poderia ter dito também que, se o diretor do filme tivesse
contado a história de cada um dos mortos, ele estaria soluçando diante da TV.
A maioria dos adultos e também das crianças sabe distinguir muito bem o que é realidade,
o que é fantasia. E, os que não sabem, não se tornarão mais violentos por conta da violência
a que assistiram no cinema, que praticaram nos videogames e nas fantasias de infância, ou
que leram nos livros e nas HQs. Quem não sabe não sabe. Nesses casos, a questão é de outra
ordem.
O perigo maior é partir do princípio de que as pessoas, crianças ou adultos, são incapazes
de diferenciar a fantasia da realidade. E, em nome disso, interferir na ficção, “purificando-
a”. Como sabemos, dos contos de fadas a Harry Potter, a ficção cumpre a função
importantíssima de nos ajudar a lidar tanto com aquilo que nos aterroriza quanto com as
pulsões de morte que nos habitam. É no ambiente controlado das histórias, no qual podemos
ter certeza do enredo, que vamos aprendendo a conviver com a realidade interna e externa,
com nossas contradições e sentimentos mais obscuros. É pelo ódio à madrasta da Branca de
Neve que uma criança pode lidar com a raiva que muitas vezes sente pela mãe na vida real.
É também matando e morrendo em embates de brincadeira que escapamos de aniquilar e
sermos aniquilados no mundo concreto. E isso até a vida adulta, de várias maneiras.
O problema começa quando não há espaço para lidar com aquilo que é do humano. Tenho
grandes dúvidas se é realmente educativo, numa sociedade armada como a nossa na vida
real, reprimir armas de brinquedo, por exemplo, eliminando a possibilidade de lidar, pela
fabulação, com um elemento presente no cotidiano. Já cansei de ouvir pedagogas em
matérias na imprensa afirmando coisas como esta: “Mesmo uma aparentemente inofensiva
pistola de bolhas de sabão incentiva a violência e poderá alterar a personalidade na vida
adulta”. Hoje, o pai ou mãe que aparecer em casa com uma metralhadora de brinquedo para
presentear o filho será condenado sem julgamento pela opinião pública. Mas, sempre que o
bom senso é esquecido, novas brechas são encontradas, porque é preciso lidar com a vida
como ela é: ou o que é a varinha mágica do Harry Potter, a do livro e as vendidas nas lojas,
além de uma arma com potencial letal? (Assim como sabres luminosos e armas
estrambóticas de super-heróis...?)
E se J. K. Rowling tivesse botado uma metralhadora na mão de Harry, em vez de uma
varinha, para que ele pudesse lidar com as constantes ameaças mortais que rondam seu
destino, graças à ambição dos adultos? Possivelmente ela jamais teria trocado os cafés onde
escreveu o primeiro volume da saga pela sua mansão de escritora best-seller. Mas a varinha
de Harry Potter e de seus amigos paralisa, deforma, tortura, incinera e pulveriza os inimigos,
mais potente do que qualquer metralhadora real. E Harry Potter só se tornou o sucesso que
é porque o personagem é tratado com respeito pela autora: Harry é um menino sensível e