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Por outro lado, o senso comum também diz que, se é gordo, só pode ser infeliz. A maioria
de nós acredita e repete isso. Fulano come demais, é infeliz. Fulano não consegue fechar a
boca, é infeliz. Fulano compensa a infelicidade comendo. Ora, desde quando magreza se
tornou sinônimo de felicidade? Você, magro ou magra, é loucamente feliz? Está rolando de
rir vida afora? Ops, magros não rolam.
O mais disfarçado dos preconceitos vem embalado pelo discurso da saúde. É verdade que
a obesidade está crescendo no Brasil. E é verdade que isso é sério. E é legítimo e relevante
pensar e discutir o fenômeno com responsabilidade.
Mas será que não há um exagero nisso? Ou pelo menos do uso preconceituoso que se faz
de uma questão tão séria? Hoje, quando olham para um gordo, além de feio, preguiçoso e
sem-vergonha, muitos enxergam também um doente. Gordura virou sinônimo de doença. E
nossa sociedade, que morre de medo de morrer, foge da doença. E das pessoas doentes. Os
gordos parecem ser os leprosos de nosso tempo. E esta seria minha primeira hipótese para
a repugnância que as pessoas gordas parecem evocar.
Não se trata de afirmar que a gordura não está relacionada a doenças — ou que a
obesidade não seja uma doença. A Organização Mundial da Saúde afirma que é, quem sou
eu para discordar. Só tento mostrar que é preciso tomar cuidado para não cometermos as
mesmas crueldades que nossos antepassados consumaram ao exorcizar epiléticos, isolar
leprosos. Todas essas práticas sempre foram realizadas “em nome do bem”. Guardadas as
proporções e o momento histórico, nossa sociedade pode estar transformando os gordos,
com os instrumentos desta época, nos culpados pela nossa impotência diante da doença e
da morte.
Hoje a vida tornou-se uma patologia. Difunde-se que muito do que sentimos não
deveríamos sentir. O ideal seria só sentir felicidade num corpo magro, musculoso e eterno.
Para cada sentimento e estado que extrapole esses limites impossíveis, há uma patologia e
uma pilha de remédios e procedimentos cirúrgicos para “curá-la”. Acredito que vale a pena
ter um pouco de cautela, enfiar alguns pontos de interrogação na cabeça, antes de sairmos
rotulando todos os gordos como doentes. E, pior, com uma doença que dependeria só de
boa vontade individual para ser curada.
Eu sou mais ou menos magra. Longe, bem longe do peso de uma modelo, mas ninguém
me chamaria de gorda na rua. A maior parte da minha família é magra. E todos nós temos
doenças. Eu tenho quatro hérnias de disco. Meu pai, mesmo com um metabolismo
fenomenal e índices de colesterol e triglicérides perfeitos, tem problemas cardíacos desde
jovem. Meu irmão do meio não tem um grama de gordura a mais no corpo, come alimentos
saudáveis e se exercita com método: a cada semana corre quatro dias, faz musculação e
natação em outros dois. Ainda assim, é um pré-diabético.