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COMUNICAÇÃO E EXPRESSÃO
O único desabafo é descobrir o mísero coração dentro do peito, sacudi-lo um pouco e
botar na boca toda a amargura do cativeiro sem remédio, antes de o apostrofar: Te dana,
coração, te dana!
(QUEIROZ, 2007).
Segundo Antunes (2010), a unidade temática do texto de Rachel de Queiroz desenvolve-se em torno
da descrição de um possível desejo da autora Rachel na passagem de ano de 1950. No texto há detalhes
sobre o que seria o desejo verdadeiro e inconfessável e depois a rendição dela aos desejos do coração. Os
pormenores desse desejo e as razões para ele não ser atendido marcam o percurso do texto.
Esse tema progride no decorrer do texto e verificamos que, ainda de acordo com Antunes (2010, P.
91-92):
(a) O pretexto inicial do texto – um desejo para o ano que começa – passa
a ser o fio condutor de todo o seu desenvolvimento.
(b) O ponto de partida é a confissão desse desejo: que tudo se dane!. Um
desejo sentido, mas inaceitável e, por isso, inconfessável (a verdade
verdadeira que eu falar não posso). Esse desejo, nos cinco parágrafos
seguintes, é detalhadamente descrito. Que se dane o mundo, que se
dane o homem amado, que se dane o público leitor, que se dane a
pátria, o dinheiro, o bom nome, o respeito, a amizade, o amor. Que
se dane a parentela. A consciência de que esse desejo não é de todo
legitimo, pois fere os princípios elementares da boa convivência, está
expressa já no título, pelo recurso ao advérbio “talvez”: Talvez o último
desejo.
(c) O tema avança na confissão da autora de que “o seu maior desejo”
seria tomar essa atitude de desprezo por tudo. Mas não o faz. E aí
prossegue no detalhamento de todos os motivos por que não o faz,
repassando quase todos os elementos considerados no bloco anterior:
o amado, o mundo, a pátria, a parentela, o respeitável público etc.
(d) E como abertura e coroamento desses detalhes, sobressai a ideia de
que o desejo de mandar que “tudo se dane!” não é viável porque o
insolente coração não deixa.
(e) Essa ideia da total submissão às leis do coração é expressa nos Revisão: Leandro - Diagramação: Léo - 14/07/2011
fragmentos O miserável coração nasceu cativo e só no cativeiro pode
viver; Prisão de sete portas, cada uma com sete fechaduras, trancadas
com sete chaves, por que lutar contra as tuas grades?; cativeiro sem
remédio. Ou seja, render-se à servidão do amor constitui um destino
incorrigível, uma espécie de sina fatal de nós todos, da qual não
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