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Capítulo 7
tem, de certa forma alterados e deturpados dos seus enredamentos ante-
riores, seja pelas formas de aquisição do alimento seja pelas significações
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e visceralidades implicadas. Agora, o consumo é associado a um risco,
mediado por incertezas e inseguranças. Essas que, enredadas pelo desas-
tre, permeiam também as falas dos representantes tecnocientíficos, vistos
pelo público abrangente como autoridades no quesito:
Então dá pra perceber aqui, não aumentou só os metais na água
após o acidente, esses metais foram transferidos para a base da ca-
deia trófica. E provocaram efeitos nesses organismos? Provocaram!
O nível de peroxidação lipídica dos organismos coletados, né, na
primeira expedição, principalmente em torno da foz do rio Doce,
apresentaram praticamente dez vezes mais lipoperoxidação do
que os que a gente encontrou na segunda e na terceira expedição.
E percebam, que legal, quando a gente entra nas áreas mais pro-
tegidas, nesses níveis não ocorrem diferenças. Então isso mostra
também que efetivamente organismos que estavam em torno da
foz do rio Doce naquele momento estavam sofrendo maior estres-
se, tá? Isso é um indicador de impacto biológico. Bom, com isso
a gente fechava aquela primeira pergunta: houve a disponibiliza-
ção do metal? Houve. Esse metal ficou biodisponível? Ficou. Esse
metal foi transferido? A gente vai ver agora. Mas ele causou um
impacto biológico em que ele foi absorvido? Causou. Na base da
cadeia trófica. Se eu destruo a base da cadeia trófica, todo o restan-
te fica comprometido, tá? Como eu disse, não dá pra explicar tudo,
então vamos focar em alguns pontos. Então a gente parte pra outra
questão que é importante: Tudo bem, se passou pro zooplâncton,
pode ter passado pra organismos de níveis tróficos mais elevados;
se eles passaram, pode ter chegado nos peixes; se chegou no peixe
e camarão, a gente pode estar em risco. Agora entramos numa outra
pergunta importante, que é questão de saúde pública, tá? Não so-
mos nós que resolvemos este problema – eu canso de dizer isso,
11 “É interessante destacar que a percepção dos entrevistados acerca do risco do consumo
de peixes parece ser sutilmente atenuado dada à sua origem: ao passo que 94% do total con-
sideraram comer peixes oriundos do Rio Doce um risco para a saúde, “apenas” 74% conside-
ram que comer peixes oriundos do mar pudesse acarretar em alguma contaminação ou dano
à saúde” (LEONARDO et al., 2017, p. 19).
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