Page 203 - LIVRO - ENCONTRO DE RIO E MAR_160x230mm
P. 203

Capítulo 7

                    tem, de certa forma alterados e deturpados dos seus enredamentos ante-
                    riores, seja pelas formas de aquisição do alimento seja pelas significações
                                                                                     11
                    e visceralidades implicadas. Agora, o consumo é associado a um risco,
                    mediado por incertezas e inseguranças. Essas que, enredadas pelo desas-
                    tre, permeiam também as falas dos representantes tecnocientíficos, vistos
                    pelo público abrangente como autoridades no quesito:

                           Então dá pra perceber aqui, não aumentou só os metais na água
                           após o acidente, esses metais foram transferidos para a base da ca-
                           deia trófica. E provocaram efeitos nesses organismos? Provocaram!
                           O nível de peroxidação lipídica dos organismos coletados, né, na
                           primeira expedição, principalmente em torno da foz do rio Doce,
                           apresentaram praticamente dez vezes mais lipoperoxidação do
                           que os que a gente encontrou na segunda e na terceira expedição.
                           E percebam, que legal, quando a gente entra nas áreas mais pro-
                           tegidas, nesses níveis não ocorrem diferenças. Então isso mostra
                           também que efetivamente organismos que estavam em torno da
                           foz do rio Doce naquele momento estavam sofrendo maior estres-
                           se, tá? Isso é um indicador de impacto biológico. Bom, com isso
                           a gente fechava aquela primeira pergunta: houve a disponibiliza-
                           ção do metal? Houve. Esse metal ficou biodisponível? Ficou. Esse
                           metal foi transferido? A gente vai ver agora. Mas ele causou um
                           impacto biológico em que ele foi absorvido? Causou. Na base da
                           cadeia trófica. Se eu destruo a base da cadeia trófica, todo o restan-
                           te fica comprometido, tá? Como eu disse, não dá pra explicar tudo,
                           então vamos focar em alguns pontos. Então a gente parte pra outra
                           questão que é importante: Tudo bem, se passou pro zooplâncton,
                           pode ter passado pra organismos de níveis tróficos mais elevados;
                           se eles passaram, pode ter chegado nos peixes; se chegou no peixe
                           e camarão, a gente pode estar em risco. Agora entramos numa outra
                           pergunta importante, que é questão de saúde pública, tá? Não so-
                           mos nós que resolvemos este problema – eu canso de dizer isso,


                    11   “É interessante destacar que a percepção dos entrevistados acerca do risco do consumo
                    de peixes parece ser sutilmente atenuado dada à sua origem: ao passo que 94% do total con-
                    sideraram comer peixes oriundos do Rio Doce um risco para a saúde, “apenas” 74% conside-
                    ram que comer peixes oriundos do mar pudesse acarretar em alguma contaminação ou dano
                    à saúde” (LEONARDO et al., 2017, p. 19).




                                                   201
   198   199   200   201   202   203   204   205   206   207   208