Page 344 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Como acontece tantas vezes, verificou-se que o inimigo era muito mais
forte do que se supunha. Caspian sentiu-se desfalecer ao ver chegar um
batalhão atrás do outro. Se bem que os soldados tivessem medo de entrar
na floresta, tinham ainda muito mais medo de Miraz; com este
comandando-os, entravam fundo na batalha, chegando por vezes às
proximidades do Monte. Claro que Caspian e os seus capitães fizeram
também repetidas incursões no campo aberto. Quase não se passava um dia
sem luta, e muitas vezes guerreavam de noite também. Mas, quase sempre,
era o exército de Caspian que levava a pior.
Chegou por fim uma noite em que as coisas não podiam ter sido
piores. A chuva, que caíra pesada durante todo o dia, só parou à tardinha,
para dar lugar a um frio mortal. Para o amanhecer, Caspian planejara o
grande ataque, no qual todos punham as suas esperanças. Caspian, com a
grande maioria dos anões, deveria atacar de madrugada a ala direita do
exército real. Quando estivessem no mais aceso da batalha, o gigante
Verruma, acompanhado pelos centauros e pelos animais mais fortes,
deveriam atacar em outro ponto, a fim de cortar a ala direita de Miraz do
resto do exército. Mas o plano falhou. A verdade é que ninguém avisara
Caspian (porque ninguém em Nárnia se lembrara disso) de que os gigantes
não costumam brilhar pela inteligência. Ora, o pobre Verruma, se bem que
corajoso como poucos, era neste aspecto um autêntico gigante. Atacara,
pois, onde não devia, em momento pouco oportuno, causando graves
perdas aos batalhões de Caspian e ao seu próprio, e quase sem causar danos
às forças inimigas. O maior dos ursos ficara ferido, um centauro mais
ainda, e era difícil encontrar no grupo de Caspian quem não tivesse
derramado sangue. Nessa noite, foi uma multidão deprimida que se juntou
debaixo das árvores gotejantes para comer uma ceia frugal. O mais triste de
todos era o gigante. Sabia que a culpa era toda dele. Sentado em silêncio,
derramou enormes lágrimas, que se juntaram na ponta de seu nariz para
caírem depois, em cascata, sobre o grupo dos ratos, que nesse momento
começava a se aquecer e a pegar no sono. Levantaram-se de um pulo,
sacudindo a água que lhes entrara pelas orelhas, torcendo os minúsculos
cobertores com que se cobriam, perguntando ao gigante, em voz
esganiçada mas imperiosa, se achava que eles ainda não estavam
suficientemente encharcados, mesmo sem aquela choradeira toda. Outros
acordaram também irritados, lembrando aos ratos que tinham sido
incorporados ao exército como sentinelas e não como banda de música. O
infeliz Verruma afastou-se na ponta dos pés, à procura de um lugar onde
pudesse chorar à vontade. Mas, por cúmulo do azar, pisou logo numa cauda
e o dono desta (a raposa, como depois se verificou) tacou-lhe uma dentada.
Nada havia a fazer. Estavam todos muito mal dispostos naquela noite.
Na caverna mágica no centro do Monte, o rei Caspian reunia um