Page 485 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Depois de ter sido instruída pela voz do chefe sobre o que não tinha
de fazer lá em cima, despediu-se dos outros, não disse mais nada, caminhou
para o fundo da escada e começou a subir sem olhar para trás. Felizmente a
luz era boa. No primeiro lance de escada havia uma janela. Enquanto subia,
ouvia o tique-taque de um relógio antigo, ali embaixo, na entrada. Chegou
ao patamar e virou para a esquerda para subir o lance seguinte, e não ouviu
mais o relógio. Finalmente chegou ao alto, vendo um longo corredor com
uma janela no fim. Devia correr por todo o comprimento da casa. Era todo
decorado com entalhes, painéis e tapetes, e de cada lado havia muitas
portas.
Ficou um instante parada e não ouviu nem o chiar de um
camundongo, nem o zumbir de uma mosca, nem o abanar de um cortinado,
nada mesmo – a não ser o bater de seu coração.
“A última à esquerda”, disse para si mesma. Achava uma crueldade
ser logo na última porta. Tinha de passar por todos os quartos. Em qualquer
um deles poderia estar o mágico: adormecido, acordado, invisível ou até
morto. Até morto! Mas não valia a pena pensar nisso. Começou a
caminhar. O tapete era tão espesso que abafava o ruído.
“Por enquanto não há nada que meta medo”, pensou Lúcia. Parecia
mesmo um corredor tranqüilo, banhado de sol, talvez um pouco tranqüilo
demais. Seria mais bonito se não fossem aqueles estranhos sinais pintados
em vermelho nas portas: rabiscos complicados e retorcidos, que tinham
obviamente um significado – significado que não deveria ser lá muito
simpático.
E mais bonito ainda seria se não existissem aquelas máscaras
dependuradas nas paredes. Não que fossem propriamente feias – ou pelo
menos muito feias –, mas os buracos vazios das órbitas eram esquisitos, e
não seria difícil imaginar que, mal virasse as costas, as máscaras
começariam a se mexer.
Depois de passar a sexta porta, Lúcia levou grande susto. Teve quase
a certeza de que uma cara espertinha, com uma barbicha, saltara da parede
e lhe fazia caretas. Obrigou-se a parar e a olhar para ela. Descobriu que
afinal não era uma cara, mas um pequeno espelho com o tamanho e o
formato de seu próprio rosto, com cabelo no alto e barbicha pendente, de
modo que, ao se olhar no espelho, o rosto dela ficou ali circunscrito,
parecendo que a barba e o cabelo lhe pertenciam.
“Foi só o reflexo do meu rosto ao passar”, disse Lúcia a si mesma.
“Não é nada. Não há nada a temer.”