Page 523 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Compreendeu  que  toda  aquela  extensão  prateada  que  vira  (sem
                  reparar)  durante  algum  tempo  era  a  areia  do  fundo  do  mar,  e  que  todas
                  aquelas manchas, ora escuras, ora brilhantes, não eram luzes, nem sombras
                  na  superfície,  mas  coisas  reais  lá  no  fundo.  Naquele  momento,  por
                  exemplo,  passavam  sobre  uma  sedosa  massa  de  verde  com  reflexos
                  avermelhados e uma larga faixa, cinza-claro, serpenteando no meio. Agora
                  que sabia, reparava melhor. As coisas escuras eram muito mais altas do que
                  as outras e se agitavam suavemente. Como árvores batidas pelo vento. Isso
                  mesmo: uma floresta submarina.

                         Passaram sobre ela, e à faixa clara veio juntar-se uma outra. Pensou:
                  “Se estivesse lá embaixo, aquela faixa haveria de parecer um caminho pela
                  floresta.  E  o  lugar  em  que  se  juntaram  os  dois  seria  uma  encruzilhada.
                  Quem me dera estar lá! A floresta está acabando. Afinal, a faixa branca é
                  mesmo  um  caminho.  Até  se  vê  a  continuação  pela  areia.  Tem  uma  cor
                  diferente.  E  está  marcada  com  qualquer  coisa  dos  lados;  parecem  linhas
                  pontilhadas.  Talvez  sejam  pedras.  Agora  está  mais  larga”.  Mas  não  era
                  verdade: a faixa estava era mais perto. Percebeu isso pela velocidade com
                  que a sombra do navio aproximou-se dela. E o caminho – tinha certeza de
                  que era um caminho – começou a ziguezaguear. Era claro que subia uma
                  colina acidentada.

                         Quando olhou para trás, foi como se olhasse do alto de um monte
                  para  um  caminho  cheio  de  curvas.  Viu  até  mesmo  os  raios  do  sol
                  atravessarem a profundidade da água e banharem o vale arborizado. A uma
                  grande  distância,  tudo  se  desvanecia  numa  neblina  verde.  Os  lugares
                  batidos de sol, no entanto, eram azuis, de um azul ultra-marinho.

                         Não podia perder tempo olhando para trás: o que lhe surgia na frente
                  era  também  perturbador.  O  caminho  agora  parecia  ter  atingido  o  alto  da
                  elevação,  correndo  em  linha  reta, sempre  em  frente. Moviam-se nele, de
                  um lado para outro, pequenas manchas.

                         De repente avistou algo maravilhoso, completamente iluminado pelo
                  sol.  Algo  de  contornos  denteados  e  nodosos,  cor-de-pérola  ou  marfim.
                  Como Lúcia passava nesse momento por cima, não pôde distinguir muito
                  bem o que era, mas, ao ver a sombra, compreendeu logo do que se tratava.
                         A luz do sol incidia nos ombros da garota, e a sombra dos objetos
                  projetava-se na areia atrás deles. Pelas formas, viu nitidamente que era uma
                  floresta de pináculos, minaretes e cúpulas.

                         – Epa! É uma cidade ou um castelo enorme! Gostaria de saber por
                  que a construíram naquela montanha tão alta.

                         Muito  tempo  depois,  já  na  Inglaterra,  ao  falar  com  Edmundo
                  encontraram uma razão, e acho que é a verdadeira: no mar, quanto mais
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