Page 522 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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                           AS MARAVILHAS DO MAR DERRADEIRO









                         Pouco depois de deixarem as terras de Ramandu, começaram a sentir
                  que já navegavam para fora do mundo.

                         Era tudo diferente. Quase não precisavam dormir, nem comer, nem
                  falar, a não ser em voz baixa. Outra coisa era a luz. Havia luz em demasia.
                  Quando o sol se erguia parecia duas ou três vezes maior que o seu tamanho
                  normal.  E  todas  as  manhãs  (era  a  sensação  mais  estranha  para  Lúcia)
                  apareciam lá no alto as imensas aves brancas, cantando a sua canção com
                  vozes humanas, numa língua que ninguém sabia, desaparecendo depois em
                  direção à Mesa de Aslam. Pouco depois, voavam de regresso e sumiam no
                  Oriente.
                         –  Como  a  água  é  transparente!  –  exclamou  Lúcia  para  si  mesma,
                  encostando-se na amurada na tarde do segundo dia.

                         A  primeira  coisa  em  que  reparou  foi  num  pequeno  objeto  escuro,
                  quase do tamanho de um sapato, movendo-se com a mesma velocidade do
                  barco. Durante certo tempo, julgou que se tratava de algo flutuando, mas a
                  certa altura a coisa passou por um pedaço de pão que o cozinheiro atirara
                  da cozinha. Parecia que ia esbarrar no pedaço de pão, mas não; passou por
                  cima dele, e Lúcia viu que o objeto escuro não podia estar na superfície.
                  Logo depois tornou-se muito maior, voltando momentos depois ao tamanho
                  de  antes.  Lúcia  já  vira  algo  semelhante  em  algum  lugar,  mas  não  se
                  recordava onde.

                         No esforço de lembrar-se, levou as mãos à cabeça, franziu o rosto e
                  pôs a língua de fora. Acabou conseguindo. Claro! Era como um vagão de
                  trem num dia cheio de sol. A sombra escura do vagão corre pelos campos
                  na  mesma  velocidade  que  o  vagão.  Quando  se  chega  a  um  barranco  a
                  sombra  se  aproxima  mais  de  nós  e  fica  maior,  correndo  pela  relva  do
                  barranco. Depois passa aquele barranco e pronto: a sombra fica outra vez
                  do tamanho normal, correndo de novo pelos campos.

                         – É a nossa sombra, a sombra do Peregrinol -disse Lúcia. – A nossa
                  sombra correndo no fundo do mar. Quando se torna maior é quando passa
                  por  cima  de  uma  colina.  Então  é  porque  a  água  é  mais  clara  do  que  eu
                  pensava. Puxa! Estou vendo o fundo do mar, lá embaixo!
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