Page 591 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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Que  maravilha  sentar-se,  sentindo-se  agasalhada  e  limpa!  De  pés
                  ainda descalços, era uma delícia andar pelo tapete gigante. Mergulhou nele
                  até os tornozelos  e não  podia  existir  coisa  melhor para pés  doloridos.  A
                  refeição  –  que  talvez  deva  ser  chamada  de  jantar  –  consistiu  em  caldo,
                  carne de peru, pastelão, castanhas assadas e frutas, à vontade.

                         Só  houve  uma  coisa  aborrecida:  a  ama  entrava  e  saía  a  todo
                  momento, trazendo de cada vez um gigantesco brinquedo, bonecas imensas
                  (maiores do que a própria Jill ), um cavalo de pau sobre rodas (do tamanho
                  de um elefante), um tambor (que parecia uma caixa-d’água), um carneiro
                  de lã... Eram grosseiros, muito malfeitos e tingidos de cores berrantes. Jill,
                  que  os  detestava,  disse  inúmeras  vezes  que  não  os  queria.  Mas  a  ama
                  respondia:

                         –  Tuc-tuc-tuc.  Meu  benzinho  vai  gostar  de  brincar  quando  estiver
                  descansadinha. Sei disso, sei disso. Tic-tic-tuc. Agora caminha, bonequinha
                  linda.

                         Não era uma cama gigante, apenas uma dessas camas esquisitas que
                  ainda  podem  ser  vistas  nos  hotéis  fora  de  moda.  Parecia  minúscula  no
                  enorme aposento. Jill pulou alegremente para cima dela, perguntando:
                         – Ainda está nevando?

                         – Não, minha graça. Agora está chovendo. A chuva vai acabar com
                  essa neve horrorosa. Amanhã a bonequinha vai poder brincar lá fora. – A
                  ama ajeitou as cobertas de Jill e deu boa-noite.

                         Não há nada pior do que ser beijada por uma giganta, ficou pensando
                  Jill, mas não por muito tempo, pois logo adormeceu.

                         A chuva caiu durante a noite toda, chicoteando as janelas do castelo.
                  A  menina  não  ouviu  nada,  dormindo  profundamente  até  meia-noite.
                  Quando chegou essa hora morta e só os camundongos faziam um pouco de
                  barulho na casa dos gigantes, teve um sonho. Sonhou que tinha acordado
                  naquele  mesmo  quarto,  com  o  clarão  da  lareira  iluminando  o  enorme
                  cavalo  de  pau.  E,  por  conta  própria,  o  cavalo  veio  rodando  em  cima  do
                  tapete, parando perto de seu rosto. E já não era mais um cavalo, mas um
                  leão  tão  grande  quanto  o  cavalo.  Depois  não  era  mais  um  leão  de
                  brinquedo, mas um leão de verdade, o Leão de Verdade, tal qual o vira na
                  montanha além do fim do mundo. Um cheiro bom encheu o quarto. Mas
                  Jill estava confusa, embora não soubesse por quê, e lágrimas correram por
                  seu rosto, molhando o travesseiro. O Leão disse-lhe que repetisse os sinais,
                  mas  ela  os  esquecera  completamente.  Foi  tomada  de  horror.  Aslam
                  agarrou-a com as mandíbulas (ela sentia seus lábios e sua respiração, mas
                  não os dentes) e levou-a até a janela. A lua brilhava. Em letras grandes,
                  estampadas no mundo ou no céu (não sabia dizer ao certo), estavam estas
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