Page 608 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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grande porto marítimo. Num lugar, havia vários barcos sendo carregados
                  ou  descarregados;  em  outro,  fardos  de  mercadorias  e  armazéns;  num
                  terceiro,  paredes  e  colunas  que  sugeriam  grandes  palácios  e  templos.  E,
                  onde  caísse  a  luz,  viam-se  centenas  de  terrícolas  acotovelando-se  em
                  silêncio  através  de  ruas  estreitas,  praças  largas,  ou  galgando  lanços  de
                  escada.  O  movimento  contínuo  produzia  uma  espécie  de  ruído  macio  à
                  medida que o barco se aproximava. Música nenhuma. Nem som de sino.
                  Nem  o  ruído  de  uma  roda.  A  cidade  era  tão  quieta  e  quase  tão  escura
                  quanto o interior de um formigueiro.

                         Depois que o barco parou à beira do cais, os três foram levados para
                  terra  e  conduzidos  à  cidade.  Multidões  de  terrícolas  (não  existiam  dois
                  iguais)  roçavam  por  eles  nas  ruas,  exibindo  caras  tristes  e  grotescas.
                  Nenhum deles demonstrou o menor interesse pelos estrangeiros. Os anões
                  pareciam tão ocupados quanto tristes, embora Jill não conseguisse entender
                  o  que  faziam.  Mas  a  movimentação  continuava,  com  pressa,  com
                  empurrões, com o macio ruído – pá-pá-pá – das passadas.

                         Chegaram  finalmente  ao  que  parecia  um  grande  castelo,  embora
                  poucas  luzes  estivessem  acesas.  Cruzaram  um  pátio  e  subiram  por
                  numerosas escadarias, chegando a uma sala sombriamente iluminada. Mas
                  a um canto – que alegria! – havia uma arcada com uma luz bem diferente: a
                  luz cálida, amarelada e honesta das lâmpadas usadas pelos homens. A luz
                  mostrava o patamar de uma escada que subia em caracol entre paredes de
                  pedra, e parecia vir do alto. Dois terrícolas postavam-se nos dois lados do
                  arco como sentinelas ou lacaios.

                         O guardião caminhou até os dois e falou, como se fosse uma senha:
                         – Muitos mergulham no Subterrâneo.

                         Os dois responderam em coro a contra-senha:

                         – E poucos retornam às terras ensolaradas. Depois conversaram até
                  que um dos anões de guarda disse:

                         –  Já  lhe  afirmei  que  a  rainha  saiu  daqui  em  sua  grande  missão.
                  Melhor  conservar  esses  viajantes  na  prisão  até  que  ela  volte.  Poucos
                  retornam às terras ensolaradas.

                         Nesse momento a conversa foi interrompida pelo que pareceu a Jill o
                  mais maravilhoso ruído do mundo. Vinha de cima, do alto da escadaria, e
                  era uma clara e ressoante voz humana, a voz de um homem jovem.
                         –  Que  confusão  você  está  fazendo  aí  embaixo,  Mulungu?  Ah!
                  Mundanos de Cima! Que venham aqui imediatamente!

                         – Queira Vossa Alteza ter a fineza de recordar – começou a dizer
                  Mulungu, mas foi bruscamente interrompido.
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