Page 612 - As Crônicas de Nárnia - Volume Único
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                                                             NO CASTELO ESCURO






                         Quando a refeição foi servida (pombo, presunto, salada e doces), e
                  todos começaram a comer, o cavaleiro negro prosseguiu:

                         – Vocês antes de tudo precisam saber, meus amigos, que nada sei
                  sobre quem fui desde que cheguei a este Mundo Escuro. Não me lembro de
                  qualquer outro tempo no qual não estivesse morando, como agora, na corte
                  desta celestial rainha; tenho a impressão de que ela me salvou de algum
                  feitiço e para cá me trouxe em virtude de sua inexcedível bondade. (Meu
                  amigo  Pé-de-Sapo,  sua  taça  está  vazia.  Permita,  por  favor,  que  eu  lhe
                  sirva.) Isso me parece muito provável, pois até o momento sou vítima de
                  um encantamento, do qual só a minha dama tem o poder de livrar-me. Há
                  uma  hora,  todas  as  noites,  na  qual  o  meu  espírito  transforma-se
                  horrivelmente e, logo depois, o  meu corpo. Pelo espírito, passo por uma
                  crise de fúria, que me faria precipitar-me sobre o melhor amigo para matá-
                  lo,  caso  não  me  amarrassem.  Depois,  tomo  a  forma  de  uma  grande
                  serpente,  esfomeada,  venenosa,  mortal.  (Por  favor,  jovem  cavalheiro,
                  queira servir-se um pouco de pombo.) Assim me dizem, e deve ser verdade,
                  pois a minha dama diz a mesma coisa. Quanto a mim mesmo, não sei de
                  nada,  pois,  passada  a  hora,  desperto  esquecido  de  meu  vil  acesso,  em
                  perfeitas  condições  físicas  e  espirituais...  apenas  um  tanto  ou  quanto
                  fatigado.  (Senhorita,  prove  um  desses  bolos  de  mel  que  vieram  de  uma
                  terra bárbara do extremo sul do mundo.) A rainha sabe, por virtude de sua
                  arte sobrenatural, que me libertarei do encantamento quando ela mesma me
                  fizer rei de uma terra do Mundo de Cima. Essa terra já está praticamente
                  escolhida, assim também como o lugar da nossa ultra-passagem para Cima.
                  Os terrícolas trabalham dia e noite cavando o acesso, e tão adiantados estão
                  que os habitantes superiores estão pisando poucos metros acima do Mundo
                  Escuro. A hora e vez desses habitantes superiores está próxima. Ela própria
                  visita a escavação esta noite, e só aguardo um recado para ir encontrá-la. O
                  delgado teto de terra que me separa do meu reino será rompido; com ela
                  servindo-me de guia e mil homens à minha retaguarda, avançarei no meu
                  cavalo para cair de chofre sobre os meus inimigos; eliminarei os principais
                  cabeças,  dominarei  as  praças  fortes  e,  sem  dúvida,  serei  coroado  rei  em
                  vinte e quatro horas.

                         – Que sorte a deles! – exclamou Eustáquio.
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