Page 45 - Os Manuscritos do Mar Morto
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2. OS HINOS DE QUMRAN E AS EPISTOLAS PAULINAS
Desde as primeiras interpretações dos MQ, estudiosos mais conscientes e
coerentes identificaram que as analogias com o NT não ocorriam de forma completa em
todo o corpus bíblico canônico cristão. Estes estudiosos procuraram identificar quais
eram os estratos do cristianismo novel que possuíam as maiores analogias com os
escritos qumrânicos (cf. FLUSSER, 2000:50-51). O que se pôde notar foi que, entre os
estratos que obtiveram maior influência, um dos mais destacados é o paulino.
Em Paulo, pode-se perceber que, diferentemente de outros escritos do NT que
apresentam semelhanças questionáveis ou possivelmente até desconexas, existe um
sistema teológico e terminológico que apresenta semelhanças consideráveis com a
literatura sectária. Algumas dessas são perceptíveis nos escritos hinários dos MQ.
Portanto, podemos presumir que essa literatura tenha servido de veículo para que Paulo
pudesse açambarcar com conceitos da teologia de Qumran.
2.1 A MÚSICA NO VELHO E NO NOVO TESTAMENTO
Para que se compreenda de maneira clara a literatura hinária e a música do NT,
não se deve esquecer o quanto esta foi receptora das influências judaicas. O AT traz
inúmeros exemplos nesse tocante que podem servir de base para recriar-se tal ambiente.
27
A música judaica no Israel Antigo, mais do que uma manifestação de louvor, era
também uma forma de educar religiosamente uma população que possuía uma cultura
oral muito forte (cf. Dt 6:6-7). Em um ambiente onde apenas uma pequena porcentagem
da população possuía o conhecimento da leitura, uma das melhores maneiras de se
educar o povo no aspecto religioso e fixar ideais nacionais como parte da consciência
coletiva era através da música.
27 Em diante, pode-se perceber que os termos “música”, “canção”, “cântico” e “hino”, serão utilizados
praticamente todas às vezes como sinônimos. Independentemente da semântica dos termos, o objetivo é a
relação que possuíam no culto judaico e cristão primevo. Sempre quando apresentado no AT ou nas
poucas passagens no NT um registro referente à música, existia por trás disso um texto hinário utilizado
no culto. Por isso, estes termos chegam a se confundir ao fazer uma análise “grosso modo” de um
pequeno processo ritualístico que se iniciava com um texto escrito e terminava com diversas formas de
cantoria. No verbete “música” do Dicionário Ilustrado das Religiões (2001), o termo está associado a
canto, utilizado como um “elemento importante nas cerimônias religiosas de muitas culturas”. Na Bíblia
Hebraica são várias as passagens que fazem alusão a estes termos como que relacionados. O verbete hino
deste mesmo dicionário define-o como um “cântico de festa e louvor”. A íntima relação entre estes
termos na hora de sua aplicação resulta na não-necessidade de diferenciação etimológica em seu uso neste
trabalho.