Page 46 - Os Manuscritos do Mar Morto
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Na maioria dos casos, as referências à música no AT estão relacionadas ao culto
litúrgico, que eram subdivididos em festividades locais, festas nacionais, culto do
Templo, cultos particulares etc. Nestas festividades de caráter religioso entoavam-se
cânticos de marchas (Nm 10:35-36, esse, de caráter guerreiro, provavelmente fazia
parte de um ritual da Arca nos combates), de colheita (Ex 23:16, uma alusão clara de
uma festividade relacionada à colheita), cânticos de vitória (Ex 15:1-18; Jz 5:1-31),
normalmente cantados em eventos da qual participavam ampla gama da população de
Israel. Outros textos do AT, mesmo não sendo hinos como os acima citados, fazem
alusão à música em Israel mencionando o uso de instrumentos musicais, como Gn 4:21
(lira e charamela), 31:27 (tamborins e lira), Is 24:8 (tambores e cítaras) etc.
Os registros relacionados à música no AT não se limitam apenas à música sacra,
mas abrangem também referências à música secular. Os cantos seculares, assim como
no caso dos sacros, eram direcionados a situações diversas. Muito provavelmente, o
cântico da vinha (5:1-7) e o da prostituta (23:16) registrados em Isaías, parecem ser
exemplos de hinos seculares. O Cântico dos Cânticos, um livro completo de poesia
amorosa profana que ganhou canonicidade, chegou a tal ponto graças a leitores
posteriores que o apresentaram como um texto religioso, atribuindo-o ao rei Salomão
(cf. FOX, 1993: 88).
Os exemplos citados acima são alguns dos poucos em que se pode afirmar uma
divisão clara entre cânticos sagrados e profanos. Em virtude da esfera religiosa ser
demasiadamente ampla e alcançar extremos da vida social e particular da população (e
dos poetas), é difícil determinar com segurança se a intenção do texto tende a ser sacra
ou profana. O que ajuda muito nesse aspecto são as diferenciações quanto ao conteúdo
dos hinos, se de fato harmonizam-se com grande parte dos escritos considerados
sagrados do período no que diz respeito a contradições com textos de maior autoridade.
A música dedicada à liturgia, por sua vez, era muito mais profunda que a
profana. Após a construção do Primeiro Templo de Jerusalém (séc. XI a.C.), a música
sacra passa a possuir um alto grau de organização. O relato de 1Cr 15:17-22, retrata a
grande virada ocorrida na tradição sacro-musical de Israel. A responsabilidade de arcar
com esta mudança coube aos levitas, profissionais de ótima conduta pessoal, com idade
apropriada (1Cr 23:3,24) e possuidores de boa experiência instrumental (1Cr 23:5). Tão
rico foi esse período de mudança que a terceira parte do livro de Salmos é atribuída a
Asaf, que foi o criador de uma escola de cantores do Templo chamada de “Filhos de