Page 63 - Os Manuscritos do Mar Morto
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importância à condição dos despossuídos tanto em aspecto material como espiritual.
Certamente, com o cristianismo expandindo-se primeiramente entre aqueles
desprovidos de condição financeira, era importante o conselho de Paulo ao instar que o
materialismo não era um caminho que levava a Deus. Esse era um conselho muito
inteligente para o fortalecimento das comunidades cristãs, que, à medida que passavam
por provações, conscientizavam-se que aquilo era necessário para a redenção (1Cor 1:8-
12). A censura que ele faz aos gálatas em 1:6-21, de estes estarem dando atenção a um
outro “evangelho”, poderia muito bem ser um desvio de conduta que trouxesse mais
satisfações para a vida carnal (possivelmente ao lado das riquezas), contrário ao estilo
de vida que o apóstolo pregava.
O uso da palavra pobre nos textos paulinos, por si só, não cria uma analogia com
os escritos qumrânicos. É perceptível que Paulo se utiliza do conceito de pobreza
fazendo uso de termos similares aos usados no mar Morto e empregando-os aos
primeiros cristãos, mas o que demonstra mais proximidade entre a doutrina paulina e a
qumrânica é sua orientação teológico-social, que percorre o mesmo caminho. Para
Paulo, os humildes, os sofredores, atribulados, e até marginalizados eram os primeiros
cristãos. Assim, pode-se ver onde existe a idéia de pobreza em sentido espiritual
retratada por Paulo.
Essa bipolarização do espaço espiritual faz com que haja a necessidade de postar
os humanos em um dos dois lados. Nessa divisão, tanto os cristãos como os da seita de
Qumran se encontravam entre os oprimidos. Ver as riquezas ao lado dos que não são
concrentes significava que estes estavam em um lado mais fácil de viver do que o
daqueles; junto dos prazeres, da perversão, da riqueza; coisas opostas à pobreza (cf. Cl
3:5).
Como dito, a semelhança com o pensamento paulino não se encontra somente no
uso de um determinado termo, mas sim no inteiro conceito de pobreza. Para isso, é
evidente que Paulo necessitava utilizar um léxico complexo, que por sua vez
correspondia ao usado em Qumran. Até que ponto o uso das palavras pode ter
contribuído para a formulação desse conceito em Paulo é difícil saber. No entanto, é
com maior facilidade que se percebe o uso do conceito pobreza, antagônico ao de
riqueza, que por fim vão estar no meio de uma estrutura teológica ainda maior, que
pertence tanto ao dualismo quanto à justificação.
Para que se compreenda melhor esse uso, utilizo o termo ‘anaw (humilde)
somado ao contexto de alguns versículos paulinos. Tanto no AT como nos MQ, o termo