Page 331 - Girassóis, Ipês e Junquilhos Amarelos - 13.11.2020 com mais imagens redefinidas para PDF-7
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sangrando contra as pedras cortantes a cada tentativa, ele começou a
desenhar círculos no ar.
Nunca Cesar teria imaginado a dificuldade do que ele era obrigado a fazer.
Sua posição completamente instável e o medo de cair e se perder no abismo,
faziam cada erguer e baixar dos braços esticados sustentando a lanterna, um
verdadeiro martírio. Lá de cima, ao menor sinal do fraquejar dos esforços,
vinham vozes ásperas que não deixavam dúvidas sobre as exigências e as
consequências de qualquer rebeldia.
Alguns puxões bruscos o faziam lembrar que o castigo para a desobediência
seria cortarem a corda para ele mergulhar no precipício infinito. Foi uma
experiência tão assustadora e traumatizante que por muitos anos depois,
Cesar sentiria um desconforto íntimo e persistente nas noites nubladas.
As horas passaram lentas e terrivelmente angustiantes.
Perto do amanhecer, quando a luz da lanterna começou a ser ofuscada pela
luz do sol nascendo por trás das montanhas, Cesar, afinal, atreveu-se a parar
os movimentos e o cansaço e a dor que sentia eram tão grandes que mesmo a
visão do precipício aterrador deixou o medo esmaecido e ele não se
movimentaria mais, nem mesmo para salvar a própria vida.
Deve ter desmaiado porque quando se deu conta novamente de si, o sol já
aparecia alto no céu. O calor estava ficando sufocante e a corda que o prendia
se retesava e se ajustava dolorosamente pelo inchaço do corpo. A lanterna
amarrada aos seus braços pesava terrivelmente. Cesar tentava erguer a cabeça
para ver os guerrilheiros lá em cima e descobrir porque não o puxavam, mas
o sol praticamente a pino o cegava.
Tentou gritar, primeiro um grito que saiu rouco, baixo, minúsculo, impossível
de se impor a quem quer que fosse, mas depois, numa segunda tentativa, mais
alto e inequivocamente desesperado. E foi então que ouviu vozes alteradas.