Page 75 - LOSURDO COMPLETO versão digital_Spread
P. 75

MARXISMO E A QUESTÃO NACIONAL (...)  | PAUTASSO - FERNANDES - DORIA


               ternet, redes sociais etc.). Com efeito, os golpes se tornam mais sofisti-
               cados, não se restringindo às quarteladas, mas envolvendo caracterís-
               ticas que envolvem criminalização e desestabilização, promovidas por
               violências de baixo e apoiadas de fora, bem como encenações voltadas
               a criar o terrorismo da indignação e eventuais apoios “humanitários”.
               Isto é, são eventos nos quais o Ocidente mobiliza seu inédito soft power –
               decidindo soberanamente quando as eleições são regulares e a violência
               é legítima – para instaurar “protetorados democráticos”.
                     Assistimos à aniquilação do que restava de Estado de Direito (rule
               of low) nas relações internacionais. Assim, se recrudescem as assimetrias
               e as desigualdades internacionais, uma espécie de silogismo de guerra. Em
               outras palavras, o universalismo busca legitimar a exportação de valo-
               res pela nação indispensável (escolhida), convertendo-se num excep-
               cionalismo etnocêntrico exaltado capaz de mobilizar, em seu direito à
               guerra (jus ad bellum), todos os recursos de poder imperial e neocolonial.
               Para tanto, são mobilizados conceitos, de modo unilateral e distorcido,
               como parte da retórica imperial. São os casos de “terrorismo”, “fun-
               damentalismo”, “antiamericanismo”, “pró-islamismo”, “ódio contra o
               Ocidente” e “antissemitismo”, cuja apresentação maniqueísta permite
               emoldurar as intervenções em favor dos civilizados, modernos, demo-
               cráticos, judaico-cristãos etc. Dessa forma, o fim da Guerra Fria não
               representou uma nova era democrática, mas uma terceira fase  na luta
                                                                          16
               entre colonialismo e anticolonialismo (IDEM, 2016, p. 218, 249; 2010),
               colocando novos desafios às lutas por independência e desenvolvimento
               nacionais.
                     Em duas das suas últimas obras, O marxismo ocidental e Um mundo
               sem guerras, a questão nacional volta a guiar as ideias do autor italiano.
               Na primeira, a crítica ao marxismo ocidental se dá justamente em fun-
               ção de estes subestimarem a importância do anti-imperialismo e das
               lutas anticoloniais, do desenvolvimento e da soberania nacionais, para
               os países periféricos objetos das experiências revolucionárias. Ou seja,

               16   A primeira vai da Revolução de Outubro a Stalingrado; e a segunda durante a Guerra Fria com as lutas de liber-
               tação nacionais (LOSURDO, 2016, p. 249-250).

                                                                                   75
   70   71   72   73   74   75   76   77   78   79   80