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MARXISMO E A QUESTÃO NACIONAL (...) | PAUTASSO - FERNANDES - DORIA
ternet, redes sociais etc.). Com efeito, os golpes se tornam mais sofisti-
cados, não se restringindo às quarteladas, mas envolvendo caracterís-
ticas que envolvem criminalização e desestabilização, promovidas por
violências de baixo e apoiadas de fora, bem como encenações voltadas
a criar o terrorismo da indignação e eventuais apoios “humanitários”.
Isto é, são eventos nos quais o Ocidente mobiliza seu inédito soft power –
decidindo soberanamente quando as eleições são regulares e a violência
é legítima – para instaurar “protetorados democráticos”.
Assistimos à aniquilação do que restava de Estado de Direito (rule
of low) nas relações internacionais. Assim, se recrudescem as assimetrias
e as desigualdades internacionais, uma espécie de silogismo de guerra. Em
outras palavras, o universalismo busca legitimar a exportação de valo-
res pela nação indispensável (escolhida), convertendo-se num excep-
cionalismo etnocêntrico exaltado capaz de mobilizar, em seu direito à
guerra (jus ad bellum), todos os recursos de poder imperial e neocolonial.
Para tanto, são mobilizados conceitos, de modo unilateral e distorcido,
como parte da retórica imperial. São os casos de “terrorismo”, “fun-
damentalismo”, “antiamericanismo”, “pró-islamismo”, “ódio contra o
Ocidente” e “antissemitismo”, cuja apresentação maniqueísta permite
emoldurar as intervenções em favor dos civilizados, modernos, demo-
cráticos, judaico-cristãos etc. Dessa forma, o fim da Guerra Fria não
representou uma nova era democrática, mas uma terceira fase na luta
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entre colonialismo e anticolonialismo (IDEM, 2016, p. 218, 249; 2010),
colocando novos desafios às lutas por independência e desenvolvimento
nacionais.
Em duas das suas últimas obras, O marxismo ocidental e Um mundo
sem guerras, a questão nacional volta a guiar as ideias do autor italiano.
Na primeira, a crítica ao marxismo ocidental se dá justamente em fun-
ção de estes subestimarem a importância do anti-imperialismo e das
lutas anticoloniais, do desenvolvimento e da soberania nacionais, para
os países periféricos objetos das experiências revolucionárias. Ou seja,
16 A primeira vai da Revolução de Outubro a Stalingrado; e a segunda durante a Guerra Fria com as lutas de liber-
tação nacionais (LOSURDO, 2016, p. 249-250).
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