Page 136 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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chapéu branco. Fanucci era um homem de aspecto brutal e nada fizera para disfarçar a cicatriz
  circular que se estendia num semicírculo branco de orelha a orelha, dando a volta por baixo do
  queixo. Tinha sobrancelhas pretas cerradas e feições grosseiras que, quando sorria, pareciam de
  maneira estranha amáveis.
    —  Ah,  meu  rapaz  —  falou  ele  a  Vito,  com  um  sotaque  siciliano  muito  carregado.  —  O
  pessoal me disse que você está rico. Você e seus dois amigos. Mas você não pensa que me tratou
  um pouco mesquinhamente? Afinal de contas, isso é meu território e vocês deviam me deixar
  molhar o bico.
    Ele  usava  a  expressão  siciliana  da  Máfia: Fari  vagnari  a  pizzu.  Pizzu  significa  o  bico  de
  qualquer passarinho, como por exemplo o canário. A própria expressão era uma exigência de
  parte do saque.
    Como  era  seu  hábito,  Vito  Corleone  não  respondeu.  Compreendeu  a  insinuação
  imediatamente e estava esperando uma exigência direta.
    Fanucci sorriu para ele, mostrando os dentes de ouro e esticando a cicatriz circular em torno
  de seu rosto. Enxugou o rosto com um lenço e desabotoou o paletó por um momento como que
  para se refrescar, mas na realidade para mostrar a arma que trazia na cintura de suas calças
  confortavelmente largas. Depois deu um suspiro e disse:
    — Você me dá quinhentos dólares e eu esqueço o insulto. Afinal de contas, a gente moça
  ignora as cortesias devidas a um homem como eu.
    Vito Corleone sorriu para ele, e mesmo para um jovem ainda inexperiente havia algo tão
  enregelante em seu sorriso que Fanucci hesitou um momento antes de prosseguir:
    —  Do  contrário,  a  policia  vai  fazer  uma  visita  a  você;  sua  mulher  e  filhos  ficarão
  envergonhados  e  na  miséria.  Naturalmente  se  a  minha  informação  sobre  os  seus  ganhos  está
  incorreta eu molharei o bico apenas um pouquinho. Mas nada menos de trezentos dólares. E não
  procure me enganar.
    Pela  primeira  vez,  Vito  Corleone  falou.  Sua  voz  apresentava  um  tom  moderado,  não
  mostrava raiva. Ele foi cortês, como competia a um jovem falando a um homem mais velho da
  importância de Fanucci. Disse brandamente:
    — Meus dois amigos estão com a minha parte do dinheiro. Tenho de falar com eles.
    Fanucci procurou tranqüilizá-lo.
    — Você pode dizer aos seus dois amigos que espero que eles me deixem molhar o bico da
  mesma  maneira.  Não  tenha  medo  de  dizer  a  eles  —  acrescentou  Fanucci  para  animá-lo.  —
  Clemenza  e  eu  nos  conhecemos  bem  um  ao  outro,  ele  compreende  essas  coisas.  Você  deve
  deixar-se guiar por ele, pois ele tem muita experiência nesses assuntos.
    Vito Corleone deu de ombros. Procurou fingir que estava um pouco embaraçado.
    —  É  verdade  —  respondeu.  —  O  senhor  compreende  que  tudo  isso  é  novo  para  mim.
  Obrigado por falar comigo como um padrinho.
    Fanucci ficou impressionado.
    — Você é um bom sujeito — disse. — Depois pegou a mão de Vito e apertou-a entre as suas
  mãos cabeludas. — Você tem respeito — continuou ele. — Uma coisa bonita nos jovens. Da
  próxima vez, você fale primeiro comigo, hem? Talvez eu possa ajudá-lo em seus planos.
    Anos depois, Vito Corleone compreendeu que o que o fez agir de modo tão perfeito e tático
  com Fanucci foi a morte do seu próprio pai, de temperamento violento, que fora assassinado pela
  Máfia  na  Sicília.  Porém,  naquela  ocasião,  tudo  o  que  ele  sentia  era  uma  raiva  gélida  de  que
  aquele  homem  planejava  roubá-lo  do  dinheiro  que  ele  conseguira  com  o  risco  da  vida  e  da
  liberdade. Não tivera medo. Na verdade, naquele momento, pensou que Fanucci fosse um bobo
  maluco. Pelo que vira de Clemenza, aquele robusto siciliano daria antes a vida do que um níquel
  de  seu  saque.  Afinal  de  contas,  Clemenza  estivera  prestes  a  matar  um  polícia  somente  para
  roubar um tapete. E o franzino Tessio tinha o ar mortal de uma víbora.
    À  noite,  porém,  no  apartamento  de  Clemenza,  do  outro  lado  da  passagem  de  ar,  Vito
  Corleone  aprendeu  outra  lição  no  aprendizado  que  estava  começando  a  receber.  Clemenza
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