Page 139 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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à força, por que não devia matar Fanucci? Certamente o mundo podia passar sem tal indivíduo.
Havia naturalmente alguns motivos práticos. Fanucci podia na verdade ter amigos poderosos
que procurariam vingança. O próprio Fanucci era um homem perigoso, não tão fácil de ser
morto. Havia a polícia e a cadeira elétrica. Mas Vito Corleone vivera sob uma sentença de morte
desde o assassinato de seu pai. Menino ainda, com a idade de 12 anos, ele fugira de seus
executores e cruzara o oceano para viver numa terra estranha, adotando um nome estranho. E
anos de tranqüila observação o convenceram de que ele tinha mais inteligência e mais coragem
do que outros homens, embora nunca tivesse tido a oportunidade de usar essa inteligência e essa
coragem.
Contudo, Vito hesitava antes de dar esse primeiro passo em direção de seu destino. Chegou a
juntar os setecentos dólares num único maço de notas e pôs o dinheiro no bolso lateral esquerdo
das calças. Entretanto, no bolso do lado direito pôs o revólver que Clemenza lhe dera para usar no
assalto do caminhão.
Fanucci chegou pontualmente às nove horas da noite. Vito Corleone colocou na mesa um
jarro de vinho caseiro que Clemenza lhe dera.
Fanucci pôs seu chapéu branco sobre a mesa ao lado do jarro de vinho. Desapertou sua larga
gravata multicolorida, com suas manchas de tomate camufladas pelos desenhos brilhantes. A
noite de verão era quente, a luz de gás, fraca. O apartamento estava bastante sossegado. Mas Vito
Corleone se achava gelado. Para mostrar sua boa fé entregou o maço de notas a Fanucci e
observou cuidadosamente como este, depois de contá-las, tirou do bolso uma carteira larga de
couro e meteu o dinheiro lá dentro. Fanucci bebeu um gole de vinho e disse:
— Você ainda me deve duzentos dólares.
O seu rosto de sobrancelhas cerradas estava inexpressivo.
Vito Corleone respondeu com sua voz fria moderada:
— Estou um pouco sem dinheiro, estou desempregado. Vou ficar devendo o dinheiro por
algumas semanas.
Isso era uma desculpa admissível. Fanucci recebera o grosso do dinheiro e esperaria. Ele
podia até ser persuadido a não receber mais nada ou a esperar um pouco mais. Exultou com o
vinho e disse:
— Ah, você é um rapaz esperto. Como é que nunca dei atenção a você antes? Você é um
sujeito muito sossegado para o que pode fazer. Eu poderia encontrar algum trabalho para você
fazer que seria muito lucrativo.
Vito Corleone mostrou seu interesse com um delicado aceno de cabeça e encheu o copo de
Fanucci despejando o vinho do jarro. Mas Fanucci pensou melhor no que ia dizer e se levantou da
cadeira apertando a mão de Vito.
— Boa noite, rapaz — disse ele. — Nada de ressentimentos, hem? Se eu puder prestar algum
serviço a você, é só me avisar. Você saiu-se muito bem esta noite.
Vito deixou Fanucci descer as escadas e sair do prédio. A rua estava apinhada de
testemunhas para mostrar que ele deixara a casa de Corleone são e salvo. Vito observava da
janela. Viu Fanucci dobrar a esquina na direção da 11ª Avenida e sabia que ele se encaminhava
para o seu apartamento, provavelmente para guardar o dinheiro antes de sair para a rua
novamente. Talvez para guardar a sua arma. Vito Corleone deixou o seu apartamento e subiu as
escadas para o telhado. Percorreu o bloco quadrado de telhados e desceu as escadas da saída de
incêndio de um sótão vazio que o deixou no quintal do prédio. Abriu a porta dos fundos a pontapés
e atravessou a porta da frente. Do outro lado da rua era o edifício de apartamentos de Fanucci.
Os prédios residenciais se estendiam para oeste somente até a 11ª Avenida. A 11ª Avenida
era constituída principalmente de armazéns e sótãos alugados pelas firmas que faziam
embarques pela Ferrovia Central de Nova York, a fim de ter acesso mais fácil aos vários pátios
de carga existentes entre a 11ª Avenida e o Rio Hudson. O edifício de apartamentos de Fanucci
era um dos poucos situados na zona deserta, sendo ocupado principalmente por ferroviários
solteiros, trabalhadores dos pátios e as prostitutas mais baratas. Essas pessoas não se sentavam na