Page 140 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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rua e conversavam como os italianos honestos, sentavam-se nos botequins bebendo o seu salário.
Assim, Vito Corleone achou muito fácil atravessar sorrateiramente a deserta 11ª Avenida e
entrar no vestíbulo do edifício de apartamentos de Fanucci. Ali sacou a arma com a qual nunca
havia disparado e esperou Fanucci.
Vito observava através da porta de vidro do vestíbulo, sabendo que Fanucci viria descendo a
10ª Avenida. Clemenza lhe mostrara a segurança da arma e ele apertara o gatilho com ela
descarregada. Mas quando ainda menino, na Sicília, com a tenra idade de 9 anos, ele fora caçar
algumas vezes com o pai, tinha atirado com uma pesada espingarda chamada lupara. Foi a sua
habilidade com a lupara, mesmo quando ainda menino, que lhe acarretara a sentença de morte
imposta pelos assassinos de seu pai.
Esperando agora no vestíbulo escuro, Vito viu o chapéu branco de Fanucci atravessar a rua
na direção da entrada do edifício. Deu uns passos para trás, os ombros comprimidos contra a
porta interna que dava para a escada. Segurava a arma em posição de disparar. A sua mão
estendida estava apenas a dois passos da porta externa. A porta girou para dentro. Fanucci,
branco, largo, cheiroso, ocupava o quadrado da luz. Vito Corleone atirou.
A porta aberta fez uma parte do som escapar para a rua, o resto da explosão da arma abalou
o edifício. Fanucci estava segurando os lados da porta, procurando manter-se ereto, tentando
alcançar sua arma. A força de sua luta arrancara os botões de seu paletó e fê-lo balançar solto. A
sua arma estava ex posta, mas exposta estava também a mancha araneiforme vermelha na
frente da camisa branca, na altura do estômago. Com muito cuidado, como se estivesse
mergulhando uma agulha numa veia, Vito Corleone disparou o segundo tiro naquela teia
vermelha.
Fanucci caiu de joelhos, escorando a porta aberta. Soltou um gemido terrível, e esse gemido,
denotando grande sofrimento físico, pareceu a Vito quase cômico. Continuou a dar esses
gemidos; Vito lembrou-se de ter ouvido pelo menos três deles antes de encostar a arma na face
suada e gordurosa de Fanucci e atirar no seu crânio. Não se passaram mais de cinco segundos
para que Fanucci tombasse morto, obstruindo a porta aberta com seu corpo.
Com muito cuidado, Vito tirou a carteira do bolso do paletó do morto e colocou-a dentro de
sua camisa. Depois, atravessou a rua para a casa de sótão, daí para o quintal e subiu pela saída de
incêndio até o telhado. Lá de cima, deu uma olhada para a rua. O corpo de Fanucci estava ainda
estendido na entrada do prédio, mas não havia sinal de qualquer outra pessoa. Duas janelas
foram levantadas no edifício, e ele pôde ver cabeças pretas movendo-se para fora, mas desde
que não podia distinguir as feições das pessoas, elas certamente também não podiam distinguir as
suas. E esses homens não dariam qualquer informação à polícia. Fanucci deveria ficar ali até
amanhecer ou até que, um rondante encontrasse o corpo. Nenhuma pessoa daquela casa
deliberadamente se exporia à suspeita ou interrogatório da polícia. Elas trancariam as suas portas
e fingiriam que não tinham ouvido coisa alguma.
Vito podia aproveitar bem o seu tempo. Andou por cima dos telhados até chegar à porta do
seu próprio telhado e desceu para o seu apartamento. Abriu a porta, entrou e tomou a fechá-la
atrás de si. Examinou a carteira do morto. Além dos setecentos dólares que dera a Fanucci, havia
apenas algumas notas de um dólar e uma de cinco dólares.
Enfiada num cantinho da carteira havia uma moeda de ouro antiga de cinco dólares,
provavelmente uma mascote. Se Fanucci fosse um gangster rico, certamente não traria consigo
sua riqueza. Isso confirmou algumas das suspeitas de Vito.
Ele sabia que tinha de livrar-se da carteira e da arma (sabendo muito, bem mesmo, então,
que devia deixar a moeda de ouro na carteira). Subiu novamente até o telhado e percorreu
algumas sacadas. Atirou a carteira para uma passagem de ar e depois tirou as balas da arma e
bateu com o seu cano na sacada do telhado, O cano do revólver não quebrou. Ele virou a arma
em sua mão e bateu com a coronha no lado de uma chaminé. A coronha partiu-se em duas
metades. Ele bateu novamente e o revólver quebrou-se em cano e coronha, duas peças
separadas. Atirou cada parte numa passagem de ar diferente. Não fizeram barulho quando