Page 137 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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praguejou, Tessio ameaçou, mas depois dois passaram a discutir se Fanucci ficaria satisfeito com
duzentos dólares. Tessio achava que sim.
Clemenza foi positivo.
— Não, esse patife “cara de cicatriz” deve ter descoberto o que apuramos com o atacadista
que comprou os vestidos. Fanucci não aceitará um níquel menos do que trezentos dólares.
Teremos de pagar.
Vito ficou espantado, mas teve o cuidado de não demonstrar.
— Por que temos de pagar-lhe? Que pode ele fazer a nós três? Somos mais fortes do que ele.
Temos armas. Por que temos de entregar o dinheiro que ganhamos?
Clemenza explicou pacientemente:
— Fanucci tem amigos, verdadeiros animais. Tem ligações com a polícia e gostaria que lhe
contássemos nossos planos, porque nos denunciaria aos tiras e obteria a gratidão deles. Então eles
lhes deveriam uni favor. É assim que ele age sempre. Tem uma licença do próprio Maranzalla
para trabalhar nesta redondeza.
Maranzalla era um gangster freqüentemente mencionado nos jornais e considerado como o
chefe de uma quadrilha de bandidos especializados em extorsão, jogos de azar e roubo à mão
armada.
Clemenza serviu vinho que ele mesmo tinha feito. Sua mulher, depois de pôr um prato de
salame, azeitonas e um pão italiano na mesa, desceu e foi sentar-se com as amigas em frente do
prédio, levando uma cadeira consigo.
Era uma moça italiana que vivia há poucos anos no país e ainda não entendia o inglês.
Vito Corleone sentou-se com os dois amigos e começou a beber vinho. Jamais usara a
inteligência antes como a estava usando agora. Sentia-se surpreso como podia pensar tão
claramente. Lembrou-se de tudo o que sabia sobre Fanucci. Lembrou-se do dia em que o
homem tivera a sua garganta cortada e correra pela rua segurando o chapéu debaixo do queixo
para aparar o sangue que escorria. Lembrou-se do assassinato do rapaz que usara a faca e dos
outros dois que tiveram a sentença anulada pelo pagamento de uma indenização. E de repente
teve certeza de que Fanucci não tinha grandes ligações, não podia ter. Nenhum homem que
informasse à polícia. Nenhum homem que permitisse que sua vingança fosse comprada por
dinheiro. Um verdadeiro chefe mafioso teria matado também os outros dois rapazes. Não.
Fanucci tivera sorte e matara um dos rapazes, mas sabia que não podia matar os outros dois
depois de estarem eles alerta. E assim acedeu em receber dinheiro em troca da suposta
vingança. Era a força brutal do próprio homem que lhe permitia arrecadar tributo dos
comerciantes e dos jogos de azar realizados nos apartamentos. Mas Vito Corleone conhecia pelo
menos uma dessas bancas de jogo que não pagava tributos e jamais acontecera qualquer coisa
ao homem responsável por ela.
E assim Fanucci agia sozinho. Ou então contratava alguns pistoleiros para determinados
serviços, pagando-lhes rigorosamente em dinheiro. O que levou Vito Corleone a tomar outra
decisão. O rumo que a sua própria vida devia seguir.
Foi dessa experiência que lhe veio a crença freqüentemente repetida de que todo homem
tem apenas um destino. Naquela noite, poderia ter pago a Fanucci o tributo e se tornado um
caixeiro de armazém com a possibilidade de ter seu próprio negócio nos anos vindouros. Mas o
destino resolvera que ele deveria tornar-se um Don e lhe trouxera Fanucci para pô-lo na
trajetória de seu destino.
Quando acabaram a garrafa de vinho, Vito disse cautelosamente a Clemenza e Tessio:
— Se vocês querem, por que não me dão duzentos dólares cada um para pagar a Fanucci?
Garanto que ele aceitará esta quantia de mim. Depois deixem tudo por minha conta. Resolverei
este problema de modo satisfatório para vocês.
Os olhos de Clemenza prontamente começaram a brilhar com desconfiança. Vito disse-lhe
friamente:
— Nunca menti a pessoas que considero minhas amigas. Fale você com Fanucci amanhã.