Page 152 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
P. 152
Nazorine e sua noiva passaram um dia feliz escolhendo o que desejavam do enorme depósito
abarrotado de móveis. O atacadista recebeu o dinheiro, os trezentos dólares arduamente ganhos
com o suor de seu sangue, enfiou-o no bolso e prometeu que a mobília seria entregue dentro de
uma semana no já alugado apartamento.
Exatamente na semana seguinte, porém, a firma falira. O grande depósito cheio de móveis
fora fechado e lacrado e destinado ao pagamento dos credores. O atacadista desaparecera para
dar aos outros credores tempo suficiente para desabafar livremente a sua raiva. Nazorine, um
destes últimos, foi ao seu advogado, que lhe informou que nada podia ser feito enquanto o caso
não fosse resolvido no tribunal e todos os credores satisfeitos. Isso levaria três anos e Nazorine
teria sorte se conseguisse recuperar dez centavos de cada dólar.
Vito Corleone ouvia essa história com sarcástica descrença. Não era possível que a lei
pudesse permitir tal roubo. O atacadista possuía seu próprio palacete residencial, uma
propriedade em Long lsland, um automóvel de luxo, e pagava a faculdade para os filhos. Como
podia ficar com os trezentos dólares do pobre padeiro Nazorine e não entregar-lhe os móveis que
ele já havia pago? Mas, para certificar-se, Vito Corleone mandou Genco Abbandando consultar
os advogados que representavam a Companhia Genco Pura.
Eles verificaram a história de Nazorine. O atacadista tinha toda a sua riqueza pessoal no
nome da esposa. O negócio de móveis era uma sociedade anônima e ele não era pessoalmente
responsável. Na verdade, ele demonstrara má fé ao receber o dinheiro de Nazorine, quando
sabia que ia pedir falência, mas isso era uma prática comum. Segundo a lei, nada se podia fazer.
Naturalmente a questão foi facilmente ajustada. Don Corleone mandou seu consigliori,
Genco Abbandando, falar com o negociante, e, como era esperado, o homem compreendeu
imediatamente a situação e providenciou para que Nazorine recebesse os seus móveis. Mas foi
uma lição interessante para o jovem Vito Corleone.
O segundo incidente teve repercussões mais amplas. Em 1939, Don Corleone resolvera
mudar a família para fora da cidade. Tal como qualquer outro pai, ele queria que os filhos
freqüentassem escolas melhores e tivessem companheiros de nível social elevado. Por interesse
pessoal, ele preferia o anonimato da vida suburbana, onde a sua reputação não era conhecida.
Comprou a propriedade da alameda em Long Beach, a qual naquela época tinha apenas quatro
casas recém-terminadas, mas bastante espaço para a construção de outras mais. Sonny estava
formalmente comprometido com Sandra e logo se casaria, e uma das casas seria para ele. Outra
se destinava ao próprio Don Corleone. A terceira para Genco Abbandando e sua família. A
última ficaria vazia por enquanto.
Uma semana depois que a alameda foi ocupada, um grupo de três trabalhadores chegou,
com toda a inocência, com seu caminhão. Alegaram que eram inspetores de forno da cidade de
Long Beach. Um dos jovens guarda costas de Don Corleone deixou os homens entrarem e os
conduziu até o forno situado no porão. Don Corleone, sua mulher e Sonny estavam no jardim
descansando e aspirando o ar da praia.
Para grande aborrecimento de Don Corleone, ele foi chamado para ir até a casa pelo seu
guarda-costas. Os três trabalhadores, todos sujeitos grandes e fortes, estavam agrupados em torno
do forno. O chefe, um homem autoritário, falou para Don Corleone com voz ríspida:
— Seu forno está em péssimas condições. Se o senhor quiser que a gente o conserte e o
refaça, terá de pagar quinhentos dólares pelo trabalho e as peças que forem necessárias e depois
a gente vai aprová-lo de acordo com a inspeção municipal. — Puxou um rótulo vermelho e
concluiu: — Colocaremos este selo nele, como o senhor vê, depois nenhum funcionário da
municipalidade incomodará mais o senhor.
Don Corleone achou graça. Tinha sido uma semana enfadonha, sossegada, em que tivera de
deixar de lado seus negócios para cuidar dos detalhes concernentes à mudança da família para
uma casa nova. Num inglês mais estropiado do que o seu habitual sotaque ligeiramente italiano,
ele perguntou:
— Se eu não pagar a vocês, que é que vai acontecer a meu forno?