Page 149 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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estúpida que podia ter conseqüências bem desagradáveis. Sonny era obviamente o chefe do
bando, sendo que os outros dois rapazes que participaram do assalto eram seus subordinados.
Foi uma das pouquíssimas vezes em que Vito Corleone perdeu as estribeiras. Tom Hagen já
vivia em sua casa há três anos, e ele perguntou a Clemenza se esse rapaz órfão tinha-se envolvido
no assalto. Clemenza balançou a cabeça negativamente. Don Corleone mandou um carro
apanhar Santino e levá-lo ao seu escritório na Companhia de Azeite Genco Pura.
Pela primeira vez, Don Corleone enfrentava a derrota. Sozinho com o filho, deixou
transbordar sua ira, xingando o grandalhão Sonny em dialeto siciliano, uma língua muito mais
satisfatória do que qualquer outra para se expressar ira. Terminou perguntando:
— Que é que lhe deu o direito de cometer essa besteira? Que foi que fez você desejar
cometer tal ato? — Sonny estava ali em pé, zangado, recusando-se, a responder. Don Corleone
disse com desprezo: — É tão estúpido. Que foi que vocês ganharam com essa noite de trabalho?
Cinqüenta dólares cada um? Vinte dólares? Você arriscou sua vida por vinte dólares, hem?
Como se não tivesse ouvido estas últimas palavras, Sonny respondeu desafiadoramente:
— Eu vi você matar Fanucci.
— Ah, ah — retrucou Don Corleone, e voltou a afundar-se na poltrona, esperando.
— Quando Fanucci deixou o edifício — acrescentou Sonny — mamãe disse que eu podia
subir para casa. Vi você subir pelo telhado e segui você. Vi tudo o que você fez. Fiquei ali e vi
você jogar fora a carteira e a arma.
Don Corleone suspirou.
— Bem, então não posso falar com você sobre como você tem de se comportar. Você não
quer acabar a escola, você não quer ser advogado? Os advogados podem roubar mais dinheiro
com uma pasta do que mil homens com armas e máscaras.
Sonny arreganhou os dentes para ele e disse manhosamente:
— Quero entrar no negócio da Família. Quando viu que o rosto de Don Corleone continuava
impassível, que ele não rira da piada, Sonny acrescentou prontamente: — Quero aprender a
vender azeite.
Don Corleone também não respondeu. Finalmente, deu de ombros.
— Todo homem tem um destino — sentenciou. Não acrescentou que o fato de o filho ter
testemunhado o assassinato de Fanucci decidira o destino de Sonny. Ele apenas virou-se para o
outro lado e falou calmamente: — Venha amanhã às nove horas. Genco mostrará a você o que
fazer.
Mas Genco Abbandando, com aquela intuição sagaz que um consigliori deve ter,
compreendeu a verdadeira intenção de Don Corleone e passou a usar Sonny principalmente
como guarda-costas do pai, uma posição na qual ele podia também aprender as sutilezas de ser
um Don. E isso pôs em relevo o instinto professoral do próprio Don Corleone, que começou a dar
ao filho mais velho preleções sobre como deveria sucedê-lo.
Além de repetir amiúde a teoria de que um homem tem apenas um destino, Don Corleone
constantemente censurava Sonny pelas suas explosões temperamentais. Don Corleone
considerava a utilização de ameaças como a mais tola atitude: o desencadeamento de raiva sem
premeditação como a atitude habitual mais perigosa. Ninguém jamais ouvira Don Corleone
pronunciar uma simples ameaça, ninguém jamais o vira numa raiva incontrolável. Era
inconcebível. E assim ele procurava ensinar a Sonny suas próprias disciplinas. Alegava que não
havia maior vantagem natural na vida do que ter um inimigo que sobrestimasse nossos defeitos, a
não ser ter um amigo que subestimasse nossas virtudes.
O caporegime Clemenza tomou Sonny pela mão e ensinou-lhe a atirar e a manejar o
garrote. Sonny não apreciava a corda italiana, ele era muito americanizado. Preferia o simples,
direto, impessoal revólver anglo-saxão, o que entristecia Clemenza. Mas Sonny tornou-se um
constante e agradável companheiro do pai, dirigindo o carro dele, ajudando-o nos pequenos
detalhes. Nos dois anos seguintes, ele se parecia com qualquer filho que tivesse entrado no