Page 165 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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freando em frente da confeitaria. Parou tão violentamente que os pneus gemeram e, antes que o
  carro quase parasse, um homem pulou do assento do motorista, movendo-se tão depressa que
  todo mundo ficou paralisado. Era Sonny Corleone.
    O  seu  rosto  de  cupido,  carregado,  com  sua  boca  encurvada,  grossa,  era  uma  horrenda
  máscara de fúria. Numa fração de segundo, estava na varanda e tinha agarrado Carlo Rizzi pela
  garganta.  Afastou-o  dos  outros,  procurando  arrastá-lo  para  a  rua,  mas  este  passou  os  seus
  enormes  braços  musculosos  em  torno  do  corrimão  de  ferro  da  varanda  e  pendurou-se  aí.
  Encolheu-se todo, procurando esconder a cabeça e o rosto entre os ombros. Sua camisa rasgou-
  se na mão de Sonny.
    O que se seguiu foi repugnante. Sonny começou a bater no acovardado Carlo com os punhos,
  xingando-o com uma voz grossa, abafada pela raiva. Carlo, apesar de seu enorme físico, não
  oferecia  resistência,  não  soltava  qualquer  grito  de  misericórdia  ou  de  protesto.  Coach  e  Sally
  Rags não se atreviam a intervir. Pensavam que Sonny pretendia matar o cunhado e não tinham
  vontade  de  partilhar  o  seu  destino.  Os  meninos  que  estavam  jogando  bola  se  reuniram  para
  xingar o motorista que os fizera dispersar, mas agora estavam observando atemorizados. Eram
  garotos duros, mas aquela cena de Sonny em sua fúria fê-los calar. Entrementes, outro carro
  parou  atrás  do  de  Sonny  e  dois  dos  seus  guarda-costas  saltaram.  Quando  viram  o  que  estava
  acontecendo,  também  não  se  atreveram  a  intervir.  Mantiveram-se  alerta,  prontos  para
  protegerem o chefe se algum espectador tivesse a estupidez de tentar ajudar Carlo.
    O que tornou repugnante o espetáculo foi a completa submissão de Carlo, e talvez foi isso que
  lhe salvou a vida. Agarrou-se firmemente ao corrimão de ferro, de modo que Sonny não pôde
  arrastá-lo para a rua e, apesar de sua força equilibrar com a do cunhado, continuou a recusar-se
  reagir. Deixou que os golpes chovessem em sua cabeça e pescoço desprotegidos, até que o furor
  de Sonny passou. Finalmente, com o peito erguido, Sonny baixou os olhos para Carlo.
    — Seu salafrário nojento, se você bater outra vez em minha irmã, eu o mato — arrematou.
    Estas palavras baixaram a tensão. Porque, é claro, se Sonny quisesse matar Carlo, não teria
  pronunciado aquela ameaça. Fê-la frustrado, porque não podia executá-la. Carlo evitava olhar
  para Sonny. Mantinha a cabeça baixa e as mãos e os braços trançados no corrimão de ferro.
  Permaneceu  assim,  até  que  o  carro  zarpou  ruidosamente  e  ele  ouviu  Coach  dizer  numa  voz
  curiosamente paternal:
    — Muito bem, Carlo, vamos entrar na confeitaria. Vamos sair da vista dessa gente.
    Somente então, foi que Carlo se atreveu a sair de sua posição agachada contra os degraus de
  pedra  da  varanda  e  desembaraçou  as  mãos  do  corrimão.  Pondo-se  de  pé,  viu  os  meninos
  olharem para ele com ar repulsivo, espantado, de gente que tinha assistido à degradação de um
  semelhante.  Sentia-se  um  pouco  tonto,  porém  isso  era  mais  devido  ao  choque  e  ao  tremendo
  medo  que  se  apoderara  de  seu  corpo;  não  estava  muito  machucado,  apesar  da  saraivada  de
  golpes pesados recebidos. Deixou Coach levá-lo pelo braço para a sala dos fundos da confeitaria
  e  colocar  gelo  no  seu  rosto,  que,  embora  não  estivesse  cortado  ou  sangrando,  apresentava-se
  cheio de equimoses e inchado. O medo estava passando agora e a humilhação que sofreu fê-lo
  passar mal do estômago, de modo que ele teve de vomitar. Coach segurou-lhe a cabeça sobre a
  pia, amparou-o como se ele estivesse embriagado, depois ajudou-o a subir até o apartamento e
  fê-lo deitar-se na cama de um dos quartos. Carlo não notara que Sally Rags desaparecera.
    Saily Rags tinha ido até a Terceira Avenida e telefonara para Rocco Lampone informando-o
  do que acontecera. Rocco recebeu a notícia calmamente e, por sua vez, telefonou para o seu
  caporegime, Pete Clemenza, que gemeu e disse:
    —  Ó  Cristo,  esse  maldito  Sonny  e  seu  gênio  —  mas  o  seu  dedo  prudentemente  havia
  abaixado o gancho do telefone, para que Rocco não ouvisse as suas palavras.
    Clemenza telefonou para a casa de Long Beach e chamou Tom Hagen. Este ouviu-o em
  silêncio por um momento.
    — Mande alguns de seus homens e carros para a estrada de Long Beach o mais depressa
  possível — disse em seguida — só para evitar que Sonny seja retido pelo tráfego ou por algum
  acidente.  Quando  ele  fica  irritado  assim,  não  sabe  que  diabo  está  fazendo.  Talvez  alguns  de
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