Page 164 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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contra a mesma equipe noutro bookmaker na cotação certa, o jogador nunca podia perder. Só
quem podia perder era a banca de Carlo. Esse erro causou um prejuízo de seis mil dólares à
banca, durante a semana, e confirmou a opinião de Don Corleone sobre o seu genro, que dissera
claramente que todo o trabalho de Carlo devia ser conferido.
Normalmente, os membros mais destacados na hierarquia da Família Corleone nunca se
interessariam por um tal detalhe operacional. Essa cúpula ficava isolada, pelo menos cinco
camadas acima dos demais membros. Todavia, como a banca estava funcionando a título de
experiência no gênero, foi posta sob a fiscalização direta de Tom Hagen, que dela recebia um
relatório diário.
Agora que os “informes” estavam anunciados, os jogadores apinhavam-se na sala dos
fundos da confeitaria para anotar a cotação nos seus jornais, ao lado dos jogos publicados ali com
lançadores prováveis. Alguns deles seguravam seus filhos pequenos pela mão, enquanto olhavam
para o quadro-negro. Um sujeito que fazia grandes apostas olhou para a garotinha que segurava
pela mão.
— De quem é que você gosta hoje, querida, dos Gigantes ou dos Piratas? — indagou à
criança.
A garotinha, fascinada pelos nomes impressionantes, perguntou:
— Os Gigantes são mais fortes do que os Piratas?
O pai deu uma gargalhada.
Uma fila começou a se formar em frente dos dois apontadores. Quando um deles
completava uma folha, arrancava-a e enrolava com ela o dinheiro que tinha recebido e a
entregava a Carlo. Este passava pela saída dos fundos da sala e subia uma escada até o
apartamento em que morava a família do próprio dono da confeitaria. Transmitia as apostas para
a banca central e punha o dinheiro num pequeno cofre de parede escondido por uma extensa
cortina de janela. Em seguida, descia para a confeitaria, depois de ter queimado a folha de
apostas e lançado as cinzas no vaso sanitário, puxando a descarga.
Nenhum dos jogos de domingo começava antes das duas horas da tarde, devido às leis
especiais referentes aos domingos; assim, após a primeira multidão de apostadores, chefes de
família que tinham de fazer suas apostas e correr para casa para levá-la à praia, vinha o pinga-
pinga dos solteiros ou dos tipos antiquados, que condenavam a família a passar o domingo em seu
apartamento quente da cidade. Esses apostadores solteiros eram os maiores jogadores,
apostavam mais alto e voltavam lá pelas quatro horas, para apostar no segundo jogo da partida
dupla. Eram esses que faziam Carlo trabalhar durante um expediente inteiro aos domingos em
horas extras, embora alguns casados telefonassem da praia para tentar recuperar o prejuízo.
Por volta de 1:30 da tarde, as apostas tinham diminuído tanto, que Carlo e Saily Rags
puderam sair e sentar-se na varanda ao lado da confeitaria, a fim de tomar um pouco de ar
fresco. Olhavam os meninos jogarem bola. Passou um carro da polícia. Nem tomaram
conhecimento dele. Essa banca tinha uma proteção muito forte do distrito policial e não podia ser
visitada por determinação de uma autoridade local. Uma batida tinha de ser ordenada pela
cúpula e mesmo então devia haver um aviso com muita antecedência.
Coach também saiu, juntando-se aos outros dois. Bateram um papo sobre beisebol e
mulheres.
— Tive de bater na mulher novamente hoje, para ensinar-lhe quem é que manda — contou
Carlo, entre gargalhadas.
— Ela está com a barriga bem grande agora, não está? — interrompeu Coach casualmente.
— Ah, ah, eu apenas dei uns bofetões na cara dela — respondeu Carlo. — Não a machuquei.
E pensou um momento.
— Ela acha que pode mandar em mim, não suporto isso.
Apareceram ainda uns apostadores soltando boatos, falando em beisebol, alguns deles
sentando-se nos degraus acima dos dois apontadores e Carlo. De repente, os meninos que
estavam jogando bola na rua se espalharam. Vinha um carro ruidosamente pelo quarteirão,