Page 236 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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CAPÍTULO 25
QUANDO KAY ADAMS se formou, aceitou um emprego de professora primária na sua
cidadezinha em New Hampshire. Nos primeiros seis meses após o desaparecimento de Michael,
ela dava telefonemas semanalmente para a mãe dele perguntando se tinha notícias do filho. A
Sra. Corleone mostrava-se muito amável e sempre desligava o telefone dizendo:
— Você é uma moça muito distinta mesmo. Esqueça Mikey e procure um bom marido.
Kay não se ofendia com essa insistência e compreendia que a Sra. Corleone falasse assim
porque estava preocupada e achava que ela era uma moça que se encontrava numa situação
impossível.
Quando terminou o seu primeiro período escolar como professora, ela resolveu ir a Nova
York comprar algumas roupas boas e ver algumas antigas colegas da faculdade. Pensou também
em procurar um emprego interessante naquela cidade. Vivera como uma solteirona por quase
dois anos, lendo e ensinando, recusando encontros amorosos, furtando-se mesmo a sair a passeio,
embora já tivesse desistido de telefonar para Long Beach. Sabia que não podia continuar assim,
que estava ficando irritadiça e infeliz. Mas acreditara que Michael lhe escreveria ou lhe enviaria
algum recado. O fato de ele não ter feito isso a humilhava profundamente; sentia-se triste por ele
não ter confiado nela.
Kay pegou um trem cedinho e alugou um quarto no hotel pelo meio da tarde. As suas amigas
estavam trabalhando e ela não queria incomodá-las nos respectivos empregos, pretendia visitá-
las à noite. E ela não tinha realmente vontade de fazer compras depois da cansativa viagem de
trem. Ficou sozinha no quarto do hotel e, ao se recordar de todas as vezes que ela e Michael
haviam usado quartos de hotel para encontros amorosos, foi tomada por um sentimento de
desolação. Foi isso, mais do que qualquer outra coisa, que lhe deu a idéia de telefonar para a mãe
de Michael em Long Beach.
O telefone foi atendido por uma voz masculina grossa com um sotaque tipicamente nova-
iorquino, para ela. Kay pediu para falar com a Sra. Corleone. Houve um silêncio de alguns
minutos e depois Kay ouviu a voz de sotaque italiano carregado perguntar quem era.
Kay ficou um pouco embaraçada agora.
— É Kay Adams, Sra. Corleone — respondeu ela. — Lembra-se de mim?
— Certamente, certamente, eu me lembro — retrucou a Sra. Corleone. — Por que você
deixou de telefonar? Casou-se?
— Oh, não — respondeu Kay. — Tenho andado ocupada.
Ficou surpresa ao ver que a Sra. Corleone estava obviamente aborrecida por ela ter parado
de telefonar.
— A senhora tem alguma notícia de Michael? Ele está bem?
Houve um silêncio do outro lado da linha e depois a voz da Sra. Corleone veio forte.
— Mikey está em casa. Ele não telefonou para você? Não viu você?
Kay sentiu uma fraqueza no estômago em conseqüência do choque e um desejo humilhante
de chorar. Sua voz desafinou um pouco quando ela perguntou:
— Há quanto tempo ele está em casa?
— Seis meses — respondeu a Sra. Corleone.
— Oh, compreendo — retrucou Kay.
E realmente compreendia. Sentiu ondas quentes de vergonha ao ver que a mãe de Michael
sabia que ele a estava tratando com tamanha desconsideração. E depois ficou zangada. Zangada
com Michael, com a mãe dele, zangada com todos os estrangeiros italianos que não tinham
sequer a cortesia de demonstrar um interesse de simples amizade, mesmo que um caso de amor
estivesse terminado. Não sabia Michael que ela ainda se interessava por ele como uma pessoa
amiga, mesmo que ele não a quisesse mais para companheira de cama, mesmo que não quisesse