Page 9 - O Poderoso Chefao - Mario Puzo_Neat
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desculpa covarde de que as suas mãos estavam amarradas por forças mais poderosas no mundo
do que ele mesmo. Não era preciso que ele fosse amigo da pessoa, nem mesmo era importante
que a pessoa não tivesse meios com que pagar-lhe o favor recebido. Apenas uma coisa era
necessária. Que a pessoa, a própria pessoa, proclamasse sua amizade. Então, não importava
quão pobre ou impotente fosse o suplicante. Don Corleone se encarregaria entusiasticamente de
resolver-lhe os problemas. E não permitiria que coisa alguma impedisse a solução do infortúnio
desse indivíduo. Sua recompensa? A amizade, o respeitoso titulo de “Don” e, às vezes, a saudação
mais carinhosa de “padrinho”. E talvez, apenas para mostrar respeito, nunca a título de proveito
próprio, algum presente humilde — um galão de vinho feito em casa, ou um cesto de taralles
apimentados feitos especialmente para honrar a sua mesa de Natal. Compreendia-se, era apenas
uma questão de cortesia, proclamar que o indivíduo estava em dívida para com ele e que tinha o
direito de convocar a pessoa, a qualquer momento, para saldar a dívida por meio de algum
pequeno serviço.
Agora, nesse grande dia, o dia do casamento de sua filha, Don Vito Corleone achava-se
postado no vão da porta de sua casa de Long Beach, para saudar os convidados, todos eles
conhecidos e de confiança. Muitos deviam a boa sorte na vida a Don Vito e. nessa ocasião íntima,
sentiam prazer em chamá-lo pessoalmente de “Padrinho”. Até as pessoas que estavam
executando os serviços da festa eram seus amigos. O barman era um velho companheiro, cujo
presente consistia em todas as bebidas do casamento e em sua própria habilidade de especialista
no assunto. Os garçons eram os amigos dos filhos de Don Corleone. A comida colocada nas
mesas de piquenique do jardim fora preparada pela mulher de Don Vito e suas amigas e o
próprio jardim enorme, alegremente engrinaldado, tinha sido adornado pelas jovens amigas da
noiva.
Don Corleone recebia todo mundo — rico e pobre, poderoso e humilde — com igual
demonstração de afeto. Não menosprezava ninguém. Esse era o seu caráter. E os convidados
exclamavam com tanto entusiasmo quão bem e se achava em seu smoking, que um observador
inexperiente poderia facilmente pensar que o próprio Don Vito era o feliz noivo.
Postados na porta com ele, estavam dois dos seus três filhos. O mais velho, batizado como
Santino, mas chamado de Sonny por todo mundo, menos pelo pai, era olhado de soslaio pelos
italianos mais velhos; com admiração pelos mais jovens. Sonny Corleone era alto para a
primeira geração americana de descendência italiana, tinha mais de 1 ,80m de altura, e sua
cabeleira abundante e ondulada fazia-o parecer ainda mais alto. O seu rosto era de um cupido
grosseiro, as feições serenas, mas os lábios arqueados eram excessivamente sensuais, o queixo
rachado em covinhas era, de um modo curioso, obsceno. Ele tinha a constituição forte de um
touro e era do conhecimento geral que fora tão generosamente dotado pela natureza, que sua
martirizada mulher temia o leito nupcial, como os descrentes outrora temiam o cavalete de
tortura. Murmurava-se que, no tempo de rapaz, quando ele freqüentava as casas de má fama,
mesmo a mais dura e valente putain, ante a visão aterrorizada de seu órgão avantajado, exigia
preço dobrado.
Aqui, na festa do casamento, algumas jovens casadas, de ancas largas e de boca enorme,
mediam Sonny Corleone com olhares audaciosamente confiantes. Mas nesse dia especial, elas
estavam perdendo tempo. Sonny Corleone, apesar da presença de sua mulher e seus três filhos
pequenos, tinha planos com respeito à dama de honra de sua irmã, Lucy Mancini. Essa moça,
plenamente ciente do fato, achava-se sentada numa mesa do jardim com seu vestido cor-de-rosa
apropriado à cerimônia, uma tiara de flores no seu acetinado cabelo preto. Flertara com Sonny
na semana passada de ensaios e apertara a mão dele nessa manhã no altar. Urna donzela não
podia fazer mais do que isso.
Ela não se importava que ele nunca seria o grande homem que o pai dele provara ser. Sonny
Corleone tinha força, tinha coragem. Era generoso e admitia-se que o seu coração era tão grande
quanto seu órgão. Contudo, ele não tinha a humildade do pai, tendo, em vez disso, um
temperamento vivo, ardoroso que o levava a cometer erros de julgamento. Conquanto fosse uma
grande ajuda no negócio do pai, muitas pessoas duvidavam de que ele se tornaria o herdeiro de