Page 33 - O Que Faz o Brasil Brasil
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futuro terrível para o Brasil. Ê que certamente não havia descoberto o
valor positivo do mulatismo e, sobretudo, a capacidade brasileira de
recuperar e trabalhar o ambíguo como dado positivo, na
glorificação da mulata e do mestiço como sendo, no fundo, uma
síntese perfeita do melhor que pode existir no negro, no branco e no
índio. E agora, suponho, estamos em posição para retornarmos à
frase notável de Antonil a fim de entendê-la em toda a sua
profundidade.
Noto, primeiramente, que Antonil não fala de branco, negro e
mulato numa equação biológica. Ao contrário, com eles constrói
uma associação social ou normal, pois que relaciona o branco com o
purgatório, o negro com o inferno e o mulato com o paraíso. Creio ser
a primeira vez que se estabelece um triângulo para o entendimento
da sociedade brasileira e isso, sustento, é significativo e importante.
Significativo porque eu mesmo tenho repetido seguidamente que o
Brasil não é um país dual onde se opera somente com uma lógica do
dentro ou fora; do certo ou errado; do homem ou mulher; do
casado ou separado; de Deus ou Diabo; do preto ou branco. Ao
contrário, no caso de nossa sociedade, a dificuldade parece ser
justamente a de aplicar esse dualismo de caráter exclusivo; ou seja,
uma oposição que determina a inclusão de um termo e a automática
exclusão do outro, como é comum no racismo americano ou sul-
africano, que nós brasileiros consideramos brutal porque no nosso
caso tudo se passa conforme Antonil maravilhosamente intuiu. Isto é,
entre o preto e o branco (que nos sistemas anglo-saxão e sul-africano
são termos exclusivos), nós temos um conjunto infinito e variado de
categorias intermediárias em que o mulato representa uma
cristalização perfeita.