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atingindo diversas camadas sociais. Creio que isso embebeu de  tal

                  modo as nossas concepções de trabalho e suas relações que até hoje
                  misturamos uma relação puramente econômica com laços pessoais

                  de simpatia e amizade, o que confunde o empregado e permite ao

                  patrão exercer duplo controle da situação. Ele assim pode governar o

                  trabalho, pois é quem  oferece o emprego, e pode controlar as
                  reivindicações  dos  empregados, pois apela para a moralidade das

                  relações pessoais que, em muitos casos, e sobretudo nas pequenas

                  empresas e no comércio, tende a ofuscar a relação patrão-

                  empregado. O caso mais típico e  mais claro dessa problemática —
                  muito complexa e a meu ver ainda pouco estudada — é o das

                  chamadas “empregadas domésticas”, as quais são pessoas que,

                  vivendo nas casas dos seus patrões, realizam aquilo que, em casa,

                  está banido por definição: o trabalho. Nessa situação, elas repetem a

                  mesma situação dos escravos da casa de antigamente,  permitindo
                  confundir relações morais de intimidade e simpatia com uma relação

                  puramente econômica, quase sempre criando um conjunto de

                  dramas que estão associados a esse tipo de relação de trabalho onde
                  o  econômico  está  subordinado ao político e ao moral, ou neles

                  embebido. Tal como  deve  ocorrer  quando a casa se mistura com a

                  rua...

                         O fato, porém, é que a concepção de trabalho fica

                  confundida num sistema onde as mediações entre casa e rua são tão
                  complexas. E onde, como vimos, casa e rua são mais que locais físicos.

                  São também espaços de onde se pode julgar, classificar, medir, avaliar

                  e    decidir    sobre     ações,      pessoas,     relações     e    imoralidades.

                  Compensando-se mutuamente e  sendo ambas  complementadas
                  pelo espaço do “outro mundo”, onde  residem  deuses  e  espíritos,

                  casa e rua formam os espaços básicos através dos quais circulamos

                  na nossa sociabilidade. Sobretudo porque o que falta na rua existe em

                  abundância na casa. E ainda porque eles não podem ser confundidos
                  sob pena de grandes confusões e desordens.
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