Page 32 - O Que Faz o Brasil Brasil
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obviamente ficassem no seu  lugar e naturalmente não  se

                  misturassem. Gobineau, como se vê, foi o pai, ou melhor, o
                  verdadeiro genitor de um dos valores mais caros ao preconceito

                  racial de qualquer sociedade hierarquizada. Refiro-me  ao  fato  de

                  que ele não se colocou contra a hierarquia que governava,

                  conforme supunha, a diversidade humana no que diz respeito aos
                  seus traços biológicos, mas foi terminantemente contrário ao contato

                  social íntimo entre elas. E é  precisamente  isso,  conforme  sabe  (mas

                  não expressa) todo racista, que implica a idéia de miscigenação, já

                  que ela  importa contato (e contato íntimo, posto que sexual) entre
                  pessoas  que, na teoria racista,  são  vistas e classificadas como

                  pertencendo a espécies diferentes. Daí a palavra “mulato”, que vem

                  de mulo, o animal ambíguo e híbrido por excelência; aquele que é

                  incapaz de reproduzir-se enquanto tal, pois é o resultado de  um

                  cruzamento entre tipos genéticos altamente diferenciados.
                         Mas, no seu horror ao  mulatismo  e ao contato íntimo e

                  amoroso entre os tipos humanos,  Gobineau não estava só. Outros

                  teóricos importantes, como Buckle, Couty e Agassiz — para ficarmos
                  com aqueles que foram influentes entre os teóricos  do  racismo  no

                  Brasil  —,  também  exprimiram  esse  medo da mistura e trataram a

                  nossa população como um todo potencialmente degenerado  de

                  híbridos  incapazes  de  criarem  alguma coisa forte ou positiva. Nesse

                  contexto, vale a pena citar um trecho escrito por Agassiz, opinando
                  precisamente  sobre a nossa sociedade: “Que qualquer um que

                  duvida dos males dessa mistura de raças, e se inclina, por mal-

                  entendida filantropia, a botar abaixo todas as barreiras que as

                  separam, venha ao Brasil. Não poderá negar a deterioração
                  decorrente do amálgama de raças, mais geral aqui do que em

                  qualquer outro país do mundo, e que vai apagando rapidamente as

                  melhores qualidades do branco, do negro e do índio, deixando um

                  tipo indefinido, híbrido, deficiente em energia física e mental.”  O
                  célebre zoólogo de Harvard fecha com Gobineau, postulando um
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