Page 194 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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da devida oportunidade à manifestação do demandado, especialmente da análise da defesa. Isso
demonstra que liminar antes da ouvida do réu jamais pode ser tutela da evidência, embora possa ser
concedida quando o tempo para a ouvida do demandado puder causar dano.
O parágrafo único do art. 311 não é apenas uma peça que não foi feita para o jogo ou que não cabe
no tabuleiro. Ao exigir direito evidente e, assim, não poder dispensar a análise da defesa, tutelada
evidência antes da ouvida do réu não é apenas uma contradição em termos; é igualmente uma tutela
que viola o contraditório e o direito da defesa. Não há como admitir que um fato constitutivo está
provado mediante documento antes da ouvida do demandado. De outro modo, o procedimento
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monitório, em caso de prova escrita que configura prova documental ou documento, também deveria
abrir oportunidade para a tutela do direito antes da citação do réu. No mínimo para que os direitos não
fossem tratados de modo diferente. E nem se diga que os incisos II e III representam formas de tutela
jurisdicional diferenciada ou especial. O inciso II afirma pressupostos para a tutela da evidência que
podem ser encontrados nas mais diversas situações de direito substancial. De outra parte, embora
relativo à hipótese específica do contrato de depósito, o inciso III está inserido num quadro em que a
lógica da tutela da evidência deve ser preservada sob pena de se ter outra forma de tutela – que não a
tutela da evidência.
10. Tutela da Evidência e Fundamentação
A tutela da evidência requer, em regra, fatos constitutivos incontroversos, ou seja, fatos
constitutivos provados mediante documento, não contestados ou reconhecidos expressamente na
contestação. Nesse caso a tutela da evidência é baseada na incontrovérsia dos fatos constitutivos e em
defesa de mérito indireta inconsistente ou infundada – alegação improvável de fatos impeditivo,
modificativo ou extintivo. Admite-se, excepcionalmente, tutela da evidência ancorada em fatos
constitutivos demonstrados mediante prova testemunhal ou pericial produzidas em outro processo.
Nessa última hipótese deve haver defesa de mérito direta inconsistente – negação infundada dos fatos
constitutivos.
De modo que a probabilidade, em regra, recai sobre a afirmação de fato impeditivo, modificativo
ou extintivo. Apenas excepcionalmente é que se pensa na probabilidade da alegação de fato
constitutivo em face da sua negação – defesa de mérito direta. Significa que, no comum dos casos, a
alegação de fato deve ser improvável. Requer-se a probabilidade de que a defesa de mérito indireta
não venha a ser acolhida.
Nesta dimensão, a fundamentação na maioria das vezes deve relacionar os documentos
apresentados com os fatos constitutivos ou esses com a não contestação ou com o seu reconhecimento
expresso e, além disso, demonstrar as razões pelas quais se entende que as alegações de fatos
modificativos, impeditivos ou extintivos são improváveis. No entanto, a justificativa obviamente não
precisará se preocupar com defesa indireta no caso em que há apenas negação dos fatos constitutivos
demonstrados mediante prova testemunhal ou pericial realizada em outro processo. Nessa situação, a
justificativa deve ter em conta a prova dos fatos constitutivos e a (in)consistência da negação do
demandado. Em outras palavras, a fundamentação deve demonstrar que a evidência derivada da
prova – que não é documento – dos fatos constitutivos não foi elidida pela defesa direta.
11. Momento Oportuno à Concessão da Tutela da Evidência
De acordo com o art. 357 do Código de Processo Civil, não sendo o caso de julgamento antecipado
do mérito ou de extinção do processo, deverá o juiz, em decisão de saneamento e de organização do
processo: i) resolver as questões processuais pendentes, se houver; ii) delimitar as questões de fato