Page 191 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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8.2. “As Alegações de Fato Puderem ser Comprovadas Apenas Documentalmente e Houver Tese
                  Firmada em Julgamento de Casos Repetitivos ou em Súmula Vinculante”

                     A regra do inciso II do art. 311 pretende sintetizar uma hipótese de direito evidente. Porém, não
                  servirá  a  um  devido  fim  caso  não  interpretada  de  acordo  com  a  elaboração  teórica  supra
                  desenvolvida.

                     Percebe-se desde logo que a norma misturou alegações de fato com questão jurídica que pode ser
                  resolvida mediante a aplicação do entendimento devidamente consolidado em Corte Suprema. A ideia
                  de  súmula  vinculante  e  de  decisão  tomada  em  “casos  repetitivos”  indica  meros  exemplos  do
                  entendimento  das  Cortes  Supremas,  que,  mais  do  que  em  qualquer  outro  lugar,  está  em  seus
                  precedentes. 98

                     Seria possível raciocinar mediante o argumento de que as alegações de fato do autor devem estar
                  provadas documentalmente, sem depender de qualquer outra prova. Porém, ao não existir qualquer
                  outra  alegação  de  fato  passível  de  demonstração  –  nem  do  réu  –,  entendimento  de  Corte  Suprema
                  serviria apenas para mais uma vez viabilizar o julgamento antecipado do mérito.
                     Isso significa que a norma só tem algum valor se interpretada no sentido de que as alegações do
                  autor, evidenciadas por documento,  têm fundamento jurídico amparado  em entendimento de  Corte
                  Suprema,  mas  as  alegações  de  fato  do  réu,  a  despeito  de  destituídas  de  seriedade,  exigem  instrução
                  dilatória.

                     Note-se que a prova dos fatos constitutivos, somada ao entendimento de Corte Suprema, retira do
                  autor qualquer necessidade de atuar no processo para convencer o juiz sobre o seu direito. A única
                  razão para o processo prosseguir está na necessidade de instrução dilatória, derivada das alegações de
                  fato  cujo  ônus  da  prova  é  do  réu.  De  modo  que,  se  tais  alegações  não  são  dotadas  de  seriedade
                  suficiente para fazer crer que podem ser ao final acolhidas, a tutela indispensável à distribuição do
                  ônus do tempo do processo (tutela da evidência) deve ser concedida.

                     8.3. “Se Tratar de Pedido Reipersecutório Fundado em Prova Documental Adequada do
                  Contrato de Depósito, Caso em que será Decretada a Ordem de Entrega do Objeto Custodiado, Sob
                  Cominação de Multa”

                     O  inciso  III  é  um  particular  –  e  especial  –  benefício  outorgado  pelo  legislador  aos  titulares  dos
                  documentos  que  espelham  contrato  de  depósito.  Nada  contra  estes.  Contudo,  há  dezenas  de
                  documentos  de  igual  natureza  não  contemplados  pelo  legislador.  Daí  que  a  regra  só  pode  ser  uma
                  encomenda da posição social que se vale destes documentos. Note-se que a curiosidade está em se ter
                  uma previsão específica, quando as demais situações de direito substancial, à falta de uma elaboração
                  teórica  capaz  de  outorgar  inteligência  ao  inciso  I  do  art.  311,  ficariam  destituídas  de  tutela  da
                  evidência. Aliás, a compreensão do inciso I a partir de uma visão teórica que beneficia toda e qualquer
                  situação  de  direito  substancial  obviamente  exclui  a  necessidade  do  inciso  III.  De  forma  que  nada
                  elimina a ideia de que o legislador – um Parlamento habitado por maioria de orientação socialista –
                  agiu apenas para bem tratar uma específica posição social. Contraditoriamente ou não – não se sabe a
                  real intenção dos parlamentares -, vale a pena advertir para a “evidência” da “falta de seriedade” – o
                  trocadilho é oportuno – com que este Parlamento agiu.

                     De qualquer forma, o conteúdo técnico da norma do inciso III não é menos vexatório. Isto porque,
                  se o objetivo é privilegiar o titular do contrato de depósito, não é suficiente aludir a “prova documental
                  adequada  do  contrato  de  depósito”.  A  tutela  da  evidência  depende  de  prova  documental  ou  de
                  incontrovérsia  de  todos  os  fatos  constitutivos.  Tratando-se  de  contrato  de  compra  e  venda,  por
                  exemplo, os fatos constitutivos do exercício da pretensão ao recebimento do preço estão no contrato e
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