Page 192 - TUTELA DE URGÊNCIA E TUTELA DA EVIDÊNCIA, Luiz Guilherme Marinoni, Ed. RT, 2017
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na entrega da coisa. No caso de contrato de depósito, é indispensável a prova do contrato e da mora na
                  entrega da coisa. É simples: só há evidência, capaz de justificar a distribuição do ônus do tempo do
                  processo mediante a imediata outorga da tutela do direito, quando os fatos constitutivos não estão na
                  dependência de demonstração.
                     Se  o  demandado  alegar  a  falsidade  do  documento  que  ampara  o  fato  constitutivo,  mostrando-se
                  necessária a produção de prova, deixa de existir evidência hábil a justificar a tutela da evidência. A
                  alegação de falsidade desconstitui a evidência intrínseca à prova documental.

                     Além disso, quando o contrato e a mora estão provados ou são incontroversos, só há razão lógica
                  para pensar em tutela da evidência quando o processo deve prosseguir para a elucidação de alegação
                  de fato impeditivo, modificativo ou extintivo que careça de consistência ou seriedade. Se assim não
                  acontecer, a hipótese é de julgamento antecipado do mérito.
                     Note-se  que  o  inciso  III  não  faz  qualquer  indicação  a  prosseguimento  do  processo  e  a  defesa  de
                  mérito  infundada.  Ora,  a  demora  do  processo  e  a  resistência  destituída  de  seriedade  são
                  imprescindíveis  para  pensar  em  tutela  da  evidência.  Portanto,  há  que  se  interpretar  o  inciso  III  do
                  seguinte modo: além da prova documental do contrato de depósito e da incontrovérsia sobre a mora,
                  há de se ter defesa de mérito indireta infundada que requeira instrução dilatória. Se esta instrução
                  não  é  necessária,  o  caso  é  de  julgamento  antecipado  do  mérito.  Ora,  se  os  fatos  constitutivos  estão
                  evidenciados e não há alegação de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos que exijam tempo do
                  processo, a solução obviamente está no julgamento antecipado, não havendo qualquer motivo para
                  cogitar de tutela da evidência.

                     8.4. “A Petição Inicial for Instruída com Prova Documental Suficiente dos Fatos Constitutivos do
                  Direito do Autor, a que o Réu Não Oponha Prova Capaz de Gerar Dúvida Razoável”

                     O inciso IV é a norma que mais se aproxima da razão teórica da tutela da evidência. Fala em prova
                  documental suficiente dos fatos constitutivos. É certo que, tendo-se em conta o significado teórico de
                  prova documental, aludir a prova suficiente constitui equívoco. É que, quando se leva à sério o conceito
                  de prova documental, dessa decorre necessariamente o fato. O documento é um objeto que tem em si o
                  fato.  Daí  que  a  única  maneira  de  negar  o  fato  representado  em  documento  é  a  alegação  da  sua
                  falsidade.  Lembre-se  que  a  prova  documental  ou  o  documento  não  se  confunde  com  a  prova
                  documentada, ou seja, com a prova que contém a declaração de uma testemunha sobre um fato ou
                  mesmo a declaração de um especialista sobre determinada situação fática. Estas provas, não obstante
                  retidas em papel, constituem declarações de testemunha e de especialista sobre um fato, vale dizer,
                  precisamente uma mera versão a respeito do fato.

                     Admitida a falta de técnica jurídica, é possível ler no lugar de prova documental prova capaz de ser
                  apresentada  mediante  papel,  ou  seja,  prova  que  pode  constituir  documento  e  também  prova
                  testemunhal  ou  pericial  documentada.  Nessa  dimensão,  a  defesa  que  pode  ser  oposta  aos  fatos
                  constitutivos  não  se  limita  à  alegação  de  falsidade.  O  réu  tem  a  possibilidade  de  requerer  prova
                  testemunhal ou pericial para negar os fatos constitutivos. Isso porque a prova testemunhal ou pericial
                  documentada  de  que  se  vale  o  autor,  ou  seja,  a  prova  produzida  em  outro  processo  de  que  o  réu
                  também participou, não é prova suficiente à demonstração dos fatos constitutivos.

                     O inciso IV fala em oposição de prova “capaz de gerar dúvida razoável”. Entretanto, o que pode se
                  opor à prova dos fatos constitutivos é a alegação de falsidade do documento ou a negação dos fatos
                  constitutivos  evidenciados  mediante  prova  testemunhal  ou  pericial  documentada.  A  alegação  de
                  falsidade, ao abrir oportunidade a prova, retira a força do documento, excluindo a possibilidade de
                  tutela da evidência. Porém, a negação do fato constitutivo e o consequente requerimento de produção
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